Os portugueses não são especialmente receptivos e sensíveis à mudança política, pelo contrário, um impulso ou um cálculo de conservação sobrepõe-se quase sempre à necessidade sentida de mudar. Muitas vezes suporta-se indulgentemente aquilo que é mau, mas garantidamente apenas mau, em vez de se optar pelo risco inerente ao que pode ser bom, com grande probabilidade de ser bom, mas, mesmo remotamente, no limite, resultar no pior que mau, no péssimo. “Quem não arrisca não petisca” ou “a sorte protege os audazes”, mandamentos da sabedoria popular que se engavetam quando se trata de decidir o essencial, a nossa vida e a dos nossos, comandada e condicionada em todos os aspectos pelos políticos e pelos partidos, por “eles”, gente cada vez mais estranha, a tangenciar a inimizade, claramente desqualificada do ponto de vista moral, mas plenos de poder, os cordelinhos que fazem mexer o mundo, o nosso salário, o nosso emprego, a nossa saúde, a nossa casa, a educação dos nossos filhos, e a diferença entre passarmos as férias numa tenda no parque de campismo de Armação de Pêra ou num hotel de três amareladas estrelas bem no centro de Benidorm.
Foge-se da mudança até por equiparação à conjugalidade, igualmente mantida por despeito às agruras da sua privação, por temor ao que lhe suceda, argumento que tem produzido tantas cornudas felicidades e tantas fiéis infelicidades. Mudar é que não, “tá quieto”!
O recrudescimento da classe média e a desproletarização favoreceram também uma atitude mental de resistência à alteração do status quo, associada frequentemente à perda de posições adquiridas ou à expectabilidade de uma margem de erro e de uma incerteza que comporta toda a mudança e que, por isso, é evitada ou rejeitada. Neste caso, o situacionismo político-ideológico abraça o mais estrito pragmatismo, e por isso não nos repugna imaginar que muitos estridentes sociais-democratas, é um exemplo!, no cantinho anónimo da mesa de voto, por inconfessáveis motivações, lá escrevinhem a cruzita no partido da câmara que é também seu patrão. “Tem de ser…”, suspirarão de alívio, sem sequer remorso de consciência de espécie alguma.
Também contribui para o medo da e à mudança a diabolização da mesma, e tal como é bem ilustrado no excelente livro <b><i>O senhor das moscas</i></b>, a maior arma de controlo social e exercício do poder é dominar o modo de produção do medo. Para tal, criam-se e dá-se ração a muitos fantasmas demagógicos, que acasalam adversários políticos com monstros impiedosos e equivalem programas políticos à chegada do apocalipse ou do dilúvio. E o medo é tão eficaz, na volumosa proporção da ignorância e desinformação.
Não menos relevante para a explicação do receio da mudança é o engordamento de clientelas políticas e económicas com ramificações sociais e familiares, e que tem um efeito de contágio devastador… e imobilizador.
Mas, mesmo com tão ponderosas razões e superiores motivos para o povo afugentar a mudança, ela existe, acontece e, em muitos casos, recomenda-se vivamente! Sim, é um facto, e ainda bem. Contudo, a mudança a que se assiste, em promessa e em realização, é mais uma ardilosa nuance, um retoque, um golpe de habilidade maquilhadora, do que verdadeira mudança, e muito menos mudança radical, revolucionária, transgressiva. Estamos no aclamado terreno discursivo da alternância em vez de alternativa, que é uma espécie travestizada de mais do mesmo, de mudar os nomes e manter as políticas.
E em momentos de crise e desencanto? A mudança é também uma fonte de esperança e um decisivo desafio, mobilizador das energias mais prementes e da inteligência mais responsável, sem egoísmos provincianos e bairristas, sem entrincheiramentos ideológicos, sem fanatismo partidário.
Por isso também, a mudança possível ocorre em vários palcos e a escolha dos protagonistas nem sempre caminha no sentido coincidente, podem pertencer a famílias políticas contrárias. E muitos, como eu, depositam esperanças de mudança em escalas diferentes e em projectos políticos diferenciados. Votarei na mudança para as legislativas, votarei na mudança para a Câmara Municipal de Beja e para a Assembleia Municipal, e votarei na continuidade na minha Junta de Freguesia. E, sem constrangimento, elegerei siglas diferentes. Porque nem o nosso voto é “cego” nem a política é o Olimpo do maniqueísmo, pois, desde logo, há que reconhecer (e não será assim uma cultura democrática madura?) quem nem sempre “nós” próprios temos razão.
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