Sempre que chega Agosto, apodera-se de mim uma vontade de abalar que dificilmente consigo conter. Agora que, por motivos profissionais, tal não me é permitido, resta-me navegar nas memórias que preservo e que hoje com os leitores reparto, assim em jeito de efeméride.
Faz por estes dias 10 anos que resolvi dar corpo a uma ideia que há muito me perseguia: fazer uma viagem de bicicleta em solitário percorrendo terras alentejanas. Na altura tinha completado 50 anos e uma vontade inabalável de marcar essa data com uma aventura que perdurasse na minha memória.
Eu, que nem ciclista era, adquirira umas semanas antes uma bicicleta para testar os meus limites. Fiz apenas três treinos sempre em crescendo (60, 70 e 80 ) no que se refere aos quilómetros percorridos e à minha fraca resistência física.
Como a coisa correu bem, resolvi dar azo ao plano que me perseguia.
Adquiri uma bicicleta melhor, juntei-lhe um par de malas apropriadas na roda traseira, uma outra junto ao guiador, e ainda, uma firme vontade de partir.
Nesse início de Agosto de 2006 fazia uma daquelas calmarias que convidavam mais ao recolhimento na fresquidão das casas, do que à aventura solitária de percorrer terras alentejanas com 40 ou mais graus nas costas de um inexperiente ciclista.
Foram nove dias e cerca de 1.000 quilómetros pedalados por essas estradas de ninguém.
Foram nove dias de solidão, mas também de descoberta. Descobri que afinal era bastante mais resistente do que supunha. Que as pessoas em geral são diferentes se vistas do alto do selim de uma bicicleta. Que o Alentejo também é sinónimo de inferno quando um homem se predispõe a ir do ponto A ao ponto B com cerca de 40 graus nas costas. Que quando atingi a meta a que me propus me senti orgulhoso e realizado.
O único senão foi que ao chegar à minha terra um conterrâneo, quando me avistou acabado de chegar dessa irrepetível viagem, e quando pensei que me vinha cumprimentar pelo feito levado a cabo, aventou-me: – Então desististes, não?
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