Caso Casa Pia

Hugo Lança Silva

professor do ensino superior

O Inverno de 2003 aqueceu com a notícia! Tinha todos os ingredientes para ser um sucesso de bilheteira: sexo, pessoas famosas, política, crime e mistério! O “Processo Casa Pia” foi a melhor novela televisiva do século XXI. O facto de envolver pessoas reais, dramas verdadeiros, emoções verídicas, sempre foi um insignificante pormenor para alguma comunicação social.
Um país que conviveu por décadas com a cobarde indiferença perante exploração de crianças no Parque Eduardo VII, encheu o peito de falso pudor por clamar por justiça e morte aos pedófilos!
De todos os quadrantes, multiplicaram-se as posições; todos os responsáveis judiciais e políticos foram unânimes: este caso teria de ser exemplar. E foi!
O “Processo Casa Pia” é um espelho da nossa depauperada justiça! O estudo deste processo mostra a realidade dos nossos tribunais. Passaram mais de quatro anos e neste momento temos uma mão cheia de nada e outra de coisa nenhuma!
O julgamento arrasta-se há mais de dois anos, com centenas de testemunhas para ouvir! Não é previsível que demore menos de dois anos. Depois, seja qual for a decisão, iremos assistir a recursos para o Tribunal da Relação, Supremo Tribunal de Justiça e um ou outro para o Tribunal Constitucional, que sempre dá para arrastar mais a coisa. Com sorte, vai conseguir-se arranjar algo para repetir o julgamento e protelá-lo para a segunda década deste século. É a força do dinheiro a contratar excepcionais advogados, exímios na delicada arte de atrasar <i>ad aeternum </i>um processo, perante as muitas possibilidades de um desactualizado Código de Processo Penal, permissivo a dezenas de manobras dilatórias. Caso este, recorde-se, que começou com uma investigação da Policia Judiciária, que dividiu o tempo entre a função de investigar e a promoção mediática, perante uma Procuradoria Geral da República, tantas vezes errática (felizmente a memória apaga-se no tempo e muitos esquecemos que o PGR declarou solenemente que Carlos Cruz não era suspeito, três dias antes da sua prisão!, entre outras trapalhadas).
Mais de quatro anos depois, os principais arguidos estão em liberdade (só não fogem do país, porque confiam que nada lhes vai acontecer), outros não chegaram a ser acusados, (alegadamente) outros não foram investigados porque caíram nas boas graças das prescrições ou bafejados por amnistias. Mas nem tudo se perdeu: venderam-se imensos jornais e as televisões aumentaram a publicidade!
Claro que tudo isto fará com que um pai que sofra a violação de um filho mate o agressor por não confiar na nossa justiça! Mas isso tem pouca importância: arranja um bom advogado e passam muitos anos até que algo lhe aconteça!

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