São recorrentes as vozes que se queixam da actividade cultural na cidade de Beja. Amiúde também a minha voz fez coro com essas, deixando escapar lamentos sobre a qualidade e a diversidade da oferta, insinuando falhas na divulgação dos eventos. E queixume sobre a oferta de cinema que, para quem sem ser cinéfilo mas gosta muito de cinema, encontra nesta área concreta grandes lacunas!
Durante anos a cidade viveu sem espaços dignos para a realização de eventos culturais: do ponto de vista arquitectónico a casa que chamam de Cultura foi sobrevivendo sem oferecer as menores condições de dignidade e, por uma década, o esforçado Capricho era o único local para os desalentados cinéfilos matarem o vício de assistir a um filme na tela. Apesar do investimento, a Casa das Artes foi desde o seu início um acto falhado! O Museu tem deficiências que só o nosso bairrismo impede de reconhecer e só com uma dose de excelente boa vontade podemos falar em turismo arqueológico na cidade.
Durante anos somaram-se erradas políticas culturais, repartindo-se culpas entre a governação nacional e regional, uma caricatura de educação, avultados subsídios distribuídos sempre pelos mesmos, para fazerem sempre a mesmíssima coisa, quase sempre sem o menor respeito pelo público, esses ingratos que nunca souberem apreciar a arte, arte da verdadeira, só compreendida pelos verdadeiros artistas!
Tomemos o exemplo do mais conceituado grupo de teatro da cidade: durante anos, viveu na sombra dos subsídios, abruptamente restringidos pela Câmara Municipal de Beja, clamaram meses por uma reunião com o presidente da Câmara, sempre autista aos públicos lamentos da companhia, numa conduta democraticamente condenável, apenas comparável com a arrogância politica que as oposições mimam o primeiro-ministro! Arte Pública que – e com a frontalidade que no passado critiquei não tenho pejo no elogio – liberto da inércia do subsídio mínimo garantido, cavalgou na procura de novos públicos, aproximou a sua oferta da procura e corre o sério risco de ter no presente ano o melhor de muitos!
Por outro lado, a iniciativa privada em Beja (ao contrário de um excelente exemplo recente em Serpa) tem-se reduzido a alguns espectáculos de música para um público mais jovem, iniciativas avulsas que pouco ou nada engrandeceram a cidade, para além do prazer efémero de assistir ao concerto do artista da moda! Como – e por mais que a frase seja injusta para o imenso esforço dos seus responsáveis – tardam demasiado em sentir-se os efeitos do Conservatório de música, que apesar de procurar educar para a música centenas de jovens, tem sido quase estéril nas consequências desse trabalho!
Mas serão estas as razões responsáveis para o queixume da falta de espectáculos no concelho e cidade de Beja?
Defendo que não! O principal responsável das debilidades na nossa oferta cultural é o bejense, excelso na arte da crítica, sublime dono do comando à distância, excepcional na arte de ficar com o traseiro refastelado no sofá, alheio a tudo o que se passa! Louváveis iniciativas na Biblioteca Municipal deparam com a indiferença da maioria de nós; eventos na Casa da Cultura – que me parece um erro insistir – sucedem-se perante a repulsa do público.
Atente-se à realidade do Pax Julia que celebrou recentemente o seu terceiro aniversário da nova era – sendo que desde esse momento, Beja voltou a ter uma sala de espectáculos digna do que acontece em qualquer cidade que não se envergonha de ser capital – ; com reparos e falhas que a tempo aqui frisei, não custa reconhecer que existe um esforço para edificar uma oferta diversificada, desde o cinema ao teatro, da dança à música, um ou outro colóquio e mesmo algumas exposições. Nem sempre da melhor qualidade é certo, mas, é igualmente certo, que mesmo espectáculos de inegável valor esbarraram na crua indiferença do público, audaz no queixume mas alheio a tudo o mais que o afasta do seu sofá e lhe é indiferente ao umbigo do consumismo. E por cada vez que a sala encheu, encontramos bons exemplos de excelentes espectáculos que esbarraram na penumbra da indiferença! Com excepção da Ovibeja, que continua a ser o único evento aos quais os bejenses acorrem, ainda que muitos com o desiderato exclusivo de criticaram com conhecimento de causa!
Quando muitos reclamam mais cultura, frequentar espaços vazios faz-me crer que Beja tem muito mais cultura que a cidade merece. E se sentimos necessidade de procurar culpados, o espelho lá de casa será um bom início… Embora obviamente que não o único!
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