Com a perfeita consciência de que me estou, mais uma vez, a pôr a jeito de algumas piadas de mau gosto e até de trocadilhos alarves, venho por este meio manifestar a minha simpatia por este animal. São vários os motivos que para isso contribuíram, e percorrem a minha vida desde a mais tenra infância até à actualidade.
Desde muito novo, na Catequese aprendi que o burro aqueceu o Menino Jesus recém-nascido no Presépio, e logo a seguir o transportou bem como à Sua Mãe, na fuga a Herodes, ajudando a salvar a vida à Sagrada Família. Aliás, testemunhei a alta cotação da asinina criatura, da forma muito traumatizante, que passo a contar. Por altura do Natal dos meus seis anos, foi-me pedido na Catequese que fizesse um desenho alusivo à época. Naquele tempo, não só não bebíamos “coca-cola”, como quem nos trazia as prendas era o Menino Jesus. Assim rapidamente, e de forma muito pouco desinteressada, decidi desenhar um Menino deitado nas palhinhas esperando com isto agradar a Deus e ao diabo, que se me revelou na catequista (uma santa, Benza-a Deus coitadinha). Pois o diabo foi quando a santinha, para me elogiar o gatafunho, me disse: “ Ai que burro tão bonito!”. O pião de lata que “zunia” e a bola de “catchumbo” (bola de borracha com pinturas a imitar couro que vira no Rosal, na loja do Emílio), que todas as noites eram motivo das minhas preces, desvaneceram-se por completo, chegando a ter a visão mística de um Menino Jesus com orelhas de burro iguais à da história recentemente ouvida, retirar-se triste com os meus brinquedos para sua consolação e meu castigo. Naquela eternidade de tempo que foram os dois dias até à noite mágica esgotei-me em “anjinhos da guarda” e “Avés-Maria” que eram as únicas entidades que se me afiguravam capazes de operar uma reviravolta no marcador do meu infortúnio. Não se me aproveitaram as guloseimas, as brincadeiras e os desenhos animados próprios da quadra, até que à meia noite o pianito e a bolinha lá estavam, luzindo como nunca mais haviam de luzir. Atribui esta enorme graça, não à intercepção de Nossa Senhora ou do anjo da guarda, mas sim à enorme gratidão do Menino relativamente ao jumento, não se importando por isso com a confusão provocada pela falta de vocação de uma catequista para pintura de elevada qualidade artística, e talvez pela falta de qualidade dos lápis de cor fornecidos.
Ainda hoje, nesta versão actual do conto “O velho, o rapaz e o burro”, continua a ser este último, a única personagem a merecer a minha total identificação. Espero sempre que todos façam aquilo que têm a fazer, apesar da vociferação da populaça, mas desde o princípio até ao fim, é o meu herói, com tenacidade e espírito de sacrifício, o único personagem que mantêm a sua dignidade intacta.
Por isso, como dizia o poeta: “Se me quiserem ofender não me chamem burro…”
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A Câmara de Castro Verde tem abertas, até 11 de Outubro, as candidaturas a apoios económicos para os alunos residentes no concelho que frequentem o