A notícia correu célere na comunicação social portuguesa no início desta semana e, como que por encanto, parece querer eclipsar-se. Mas é importante que não sejamos cúmplices nesse silêncio e que reflictamos sobre a realidade que se nos apresenta fria: o número de crianças entradas nos hospitais com sinais claros de fome, repito, de fome, aumentou e tornou-se muito mais habitual do que qualquer cidadão minimamente informado poderia imaginar. E não é, seguramente, um problema recente. Até porque não faltaram as rápidas soluções de alguns departamentos governamentais com as respostas na ponta da língua, providenciando a rápida dilatação do funcionamento das cantinas escolares e o lançamento dum programa que “ensinará” os pais a alimentar mais racionalmente e de uma forma mais económica os seus filhos. Juntando estes episódios ao aumento exponencial das dívidas às redes de telemóveis, ou ao incumprimento do pagamento dos empréstimos aos bancos, à deflação da economia no mês de Março ou ao número de desempregados que cresce em catadupa nas filas dos centros de emprego, parece-nos mais que evidente que vivemos numa sociedade em risco eminente de colapso. Mas mais grave que tudo, e o que mais me aflige, é o rotundo falhanço das sociedades modernas, e em particular da portuguesa, no garantir de uma das mais primárias e elementares necessidades de qualquer cidadão: o pão! Recordo-me dos anos sessenta e dos miúdos descalços, ranhosos e com um bocado de pão na boca. Vivi lado a lado com essa realidade, sem que a tenha sofrido directamente, diga-se em abono da verdade. Mas vivi igualmente a profunda alteração que os primeiros anos a seguir ao 25 de Abril trouxeram. Seguramente, nunca imaginei em pleno século XXI, trinta e cinco anos depois da revolução dos cravos, voltar a coabitar com essa realidade. Paz, pão, habitação era o slogan que a plenos pulmões se pedia para cumprir Abril. Para se cumprir a Revolução. Mas a minha geração não o conseguiu. Os projectos que geriram este país ao longo das últimas três dezenas de anos falharam redondamente na garantia dos mais elementares direitos da população. Falta a cultura (veja-se o miserável valor do PIB para a Cultura), a educação (este ano são menos 100 milhões de euros para as universidades!), o trabalho (estamos com uma das mais altas percentagens de desemprego dos últimos vinte anos), a habitação (a maioria dos bairros sociais são guetos transvestidos de casas com dignidade) e o pão (no Portugal do século XXI as crianças entram nos hospitais com fome). O sonho de Abril desvanece-se na apreensiva frieza dos números. Não tenho soluções, mas gostaria de ver discutir com seriedade este Abril que temos, 35 anos depois. Gostaria de ver as pessoas a pensar as soluções para outra realidade. Outras soluções que não fossem apenas a da caridadezinha e dos milagres televisivos de ocasião. Gostaria de ver outra vez Abril na rua.

Eleições no PS. Pedro Nuno Santos encontra-se com apoiantes em Beja
Pedro Nuno Santos, candidato à liderança do PS nas eleições internas de dezembro, vai estar nesta sexta-feira, 30, pelas 21h00, em Beja, para um encontro