A crise: uma questão de matemática!

Quinta-feira, 17 Setembro, 2020

Maria Fernanda Romba

Perguntado sobre os efeitos da crise e, mais concretamente, sobre os últimos números divulgados relativos às taxas da inflação e ao perigo de deflação, o senhor Presidente da República terá dito que a culpa era da Matemática. Bem, eu sei que não foram exactamente estas as palavras que ele utilizou, mas não tenho dúvidas que ele pretendia que fosse esta a ilação a tirar, até porque as palavras foram ditas nesse contexto – e sabemos quanto o contexto é importante nestas coisas –, já que foram proferidas durante a visita a uma universidade, integrada no Roteiro para a Ciência.
Já muito foi dito sobre a crise por parte dos melhores economistas e outros especialistas financeiros do nosso país. Mas eu, que não passo duma simples “dona de casa”, acho que o senhor Presidente da República tem razão. Desta vez. O “ponto” – sinal ortográfico que acabei de colocar – não significa que só tenha tido razão desta vez, como muitos estariam já a concluir. Não. Quer, apenas e tão só, dizer o que disse. Que desta vez eu acho que tem razão. Ponto. Este “ponto” agora é, como já perceberam, a forma de encerrar este “ponto” senão não saímos dele.
E porque é que eu digo que concordo com o senhor Presidente? Eu explico.
É que eu também há muito desconfiava que a maioria de nós não era grande coisa em contas. Senão, vejamos: a maioria de nós, de forma escandalosa e autista, consome em exagero, compra o que não precisa e, o que é mais grave, desperdiça o que está em excesso. A maioria de nós desperdiça bens essenciais, como são os bens alimentares. E fá-lo duma forma banal! Tão banal que nem se sente afectado pelas notícias que, entre uma garfada de arroz e outra de carne, vão dando conta de gente que não tem o que comer.
Muitos desbaratam o dinheiro que não têm, ou seja, assumem compromissos e despesas muito superiores aos seus rendimentos e proventos. Durante anos, analisaram-se estes comportamentos dos portugueses, fizeram-se debates, tiraram-se conclusões e os portugueses saíram ilibados. E assim sendo, continuaram como se nada fosse com eles. O mal, afinal, estava nos bancos. Que incitavam ao crédito, que ofereciam cartões que os portugueses, vaidosamente, exibiam nas carteiras. Como um estatuto. Como os galões duma qualquer patente. E com eles compravam-se coisas, muitas coisas, sempre coisas a encherem-nos as casas de coisas, a encolherem o espaço que dispomos para viver. E a aumentarem as dívidas… a roubarem-nos o sono. E a perdermos o gosto pela vida. O gosto de ir à pesca pela manhãzinha cedo. O gosto para uma “futebolada” com os amigos, lembrando os tempos em que se ia de baliza a baliza em muito menos tempo e o joelho não doía como agora. O gosto por um serão, noite dentro, com muita conversa à mistura, daquelas que atravessam continentes e ora estão na Guerra de África ora na carteira da escola, sentados a preceito e entoando as linhas-férreas. De carreirinha. Tempos em que, apesar das taxas de analfabetismo, sabíamos, todos, letrados e iletrados, que 2+2=4 mas que de 4 laranjas não se podiam retirar 6.
Agora, parece que desaprendemos. Pelo menos no que toca à matemática.
E porque, como diria o Chico Buarque, “a coisa aqui tá preta”… está mais do que na hora de aprendermos, todos, a fazer contas. Salva-se a matemática. Salva-se a Ciência. E talvez nos safemos da crise…
Diz o senhor Presidente. E digo-vos eu, que não passo duma simples “dona de casa”.

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