1973: O Declínio da Brigada do Reumático

Napoleão Mira

Escritor

Estamos por estes tempos a dar início às celebrações dos 50 anos da Revolução dos Cravos. Nesse sentido, justifica-se fazer um exercício de memória e recuar àquele que seria o último ano da Ditadura.
Em 1973, para o cidadão comum, a vida decorria poucochinha, cinzenta, aborrecida e sem grandes expectativas de um futuro melhor.
No entanto, para outros, os inconformados, este foi o ano em que se decidiu que não dava mais para suportar. A mudança era necessária e inevitável.
Nesse ano, as Brigadas Revolucionárias, a 9 de março, fazem deflagrar bombas em instalações militares, nomeadamente no DRM de Lisboa e nos Serviços Mecanográficos do Exército. Voltam à carga com novo ataque bombista, a 1 de maio. Desta feita o alvo foi o Ministério das Corporações.
Este é também o ano em que é assassinado, a 20 de janeiro, por um comando português em Conakry, Amílcar Cabral. Nesse mesmo ano, o PAIGC, reunido em Medina do Bué, declara unilateralmente a independência da Guiné Bissau. Dois meses depois, a 26 de novembro, a ONU reconhece a soberania do novel país, isolando ainda mais Portugal que, por esta altura, vivia uma situação de descrédito internacional sem precedentes.
Ainda no início do ano, a 25 de janeiro, Francisco de Sá Carneiro abandona a Assembleia Nacional, dando um sinal inequívoco que não pactuava mais com o raquitismo político com que Marcello Caetano mergulhara o país.
Pressentindo que a mudança se aproximava, Mário Soares e os seus camaradas fundam na Alemanha o Partido Socialista, aquando do congresso clandestino levado a cabo pela Ação Socialista Portuguesa.
Entretanto, a guerra colonial continuava nas três frentes onde se encontrava ativa, com especial destaque para a Guiné onde o general António de Spínola pretendia uma saída militar menos embaraçosa que a derrota política entretanto desferida.
Se hoje falamos de uma crise habitacional sem precedentes, é melhor que recuemos a este ano para confrontarmos a qualidade e habitabilidade das casas de então. Lisboa possuía em 1973 cerca de 20.000 barracas (muitas delas em zonas nobres da cidade) sem quaisquer infraestruturas ou condições que fossem condizentes com a dignidade que assiste a qualquer ser humano. E apesar da habitação social começar a dar os primeiros passos, muitos habitantes recusavam a mudança por não poderem comportar o preço das rendas que, apesar de sociais, mesmo assim, não lhes permitia chegar ao fim do mês com comida na mesa.
Por fim, e para nossa esperança, a 9 de setembro, no Monte Sobral, em Alcáçovas, deram-se início às reuniões conspirativas dos militares que a 24 de novembro e 31 de dezembro desse ano, em novos encontros decisórios, determinaram que não havia volta a dar e a destituição da “brigada do reumático” que governara o país nos últimos 48 anos tinha de ser uma realidade.
Desde então – mais propriamente depois de 24 de abril de 1974 – temos vivido aos repelões com prolongadas crises e dores de crescimento, mas sempre em Liberdade. Liberdade essa, tão ou mais importante que o ar que respiramos e que devemos guardar, acarinhar, proteger, como se fora uma rara e frágil flor que devemos regar todos os dias.

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