As dificuldades financeiras têm marcado o primeiro ano de gestão da nova administração da Empresa Municipal de Água e Saneamento (EMAS) de Beja, como reconhece o seu administrador-executivo em entrevista ao “CA”. Rui Marreiros admite que a situação financeira da empresa continua a ser “reservada”, mas confia num futuro mais risonho.
A nova administração da Empresa Municipal de Água e Saneamento (EMAS) de Beja está em funções há praticamente um ano. Qual o actual quadro financeiro da empresa, depois dos problemas sentidos no final de 2017 devido a compromissos assumidos pela anterior gestão?
O quadro financeiro continua a ser preocupante, mas podemos fazer esta análise dividindo o problema em dois momentos diferentes. Tivemos aquele momento inicial, mais exigente no imediato, em que fomos confrontados com a necessidade imediata de liquidar valores muitíssimo elevados relativamente a um conjunto de intervenções que foram realizadas pela administração anterior. Estamos a falar de cerca de 2,5 milhões de euros, sendo que as primeiras prestações de empréstimos de curto prazo que foi preciso liquidar surgiram poucas semanas depois da tomada de posse desta nova administração. As coisas não estavam programadas nem preparadas e isso exigiu uma enorme capacidade de negociação com a banca, no sentido de conseguir esse financiamento num curto espaço de tempo, mas também com os próprios empreiteiros. Foi preciso fazer a ponte entre estes dois players e conseguir resolver a situação… E conseguiu-se!
Como?
Tivemos um empréstimo bancário nas melhores condições possíveis naquela altura e nos meses que se seguiram liquidámos toda a dívida que existia a esse nível. Do ponto de vista imediato a situação ficou resolvida. Mas resolveu-se um problema e ficámos com outro…
Qual?
Os encargos dessa dívida, que vamos começar a pagar em 2019. E isso limita-nos muito relativamente às opções futuras! Portanto, o maior problema – além do investimento – foram as decisões tomadas ao nível das intervenções que foram feitas, que maximizaram em pouco os benefícios para a própria empresa. Uma empresa como a EMAS, quando faz investimentos desta ordem, de 2,5 milhões de euros, não tem outro objectivo senão melhorar o funcionamento da rede, diminuir as perdas, melhorar a qualidade do serviço. Mas aquilo que aconteceu foi que essas opções tiveram outros critérios, foram tomadas com base em natureza mais política que técnica. Diria que fomos obrigados e gastar o dinheiro, ficámos com os problemas, a dívida e os encargos associados. Agora vamos ter que honrar os compromissos e estamos limitados em termos futuros. E no médio prazo temos outro problema financeiro, que tem a ver com a dívida à empresa Águas Públicas do Alentejo (AgdA), cerca de 2,5 milhões que também temos de pagar.
E já há um plano de pagamentos definido?
Estamos a negociar… Aliás, e para evitar que a situação se agravasse e ganhar espaço negocial a primeira medida que tomámos foi que a partir de 1 de Janeiro de 2018 a EMAS de Beja iria deixar de acumular dívida liquidando todas as faturas que surgissem desde esse dia. É uma questão de honra, para evitar que a situação se agravasse. Agora estamos a negociar (e há abertura da AgdA) para termos um acordo de pagamento [do montante em atraso] e um plano de amortização diferido no tempo para resolvermos mais essa questão. Está a ser ponderado o recurso e envolvimento do Banco Europeu de Investimentos para apoio esta operação. Vamos seguramente resolvê-la!
À luz deste quadro, pode dizer-se que a situação financeira da EMAS está neste momento controlada?
A situação está controlada do ponto de vista da continuidade do serviço, da sustentabilidade e da qualidade a que estamos obrigados… E mesmo num cenário desta natureza conseguimos ter algumas melhorias em termos operacionais. Mas em termos financeiros, a situação está muito reservada numa altura em que era importante – até estrategicamente – termos uma capacidade financeira diferente! Mas não temos e estamos a fazer tudo e a optimizar os recursos que temos à nossa disposição para que a situação não se agrave. Gostamos do rigor, damos muita importância à questão financeira e com toda a certeza que as coisas vão melhorar. Precisamos é de um tempo de adaptação… Aliás, não é a primeira vez que a situação da EMAS atinge momentos muito preocupante e coincidência (ou não) também não é a primeira que uma nova administração por mim liderada tenta resolver essa situação. Já o fizemos no passado, estamos a fazê-lo agora e seguramente com sucesso.
A EMAS anunciou recentemente ter alcançado os melhores resultados da década ao nível da operação, reduzindo em 50% o número de roturas face a 2017. Isso deve-se a quê?
A uma abordagem diferente do problema. Estas situações de crise também nos estimulam a termos novas soluções para problemas antigos. E esta nova solução incidiu num dos maiores problemas que tínhamos – e que mais uma vez não foram resolvidos pelos tais investimentos –, que eram as roturas nos ramais. Cerca de 85% desses problemas ocorriam nos ramais domiciliários e esse era o problema que, no imediato, precisávamos de resolver muitos problemas com pouco dinheiro, o que é possível fazer acontecer desde que haja capacidade de gestão para o efeito. E foi isso que fizemos! Centrámo-nos nessa questão, com os nossos meios internos e com mais três empresas em regime de outsourcing, e substituímos um grande conjunto de ramais domiciliários, mais de 600 até ao momento. Fizemos essa substituição em massa e isso, naturalmente, que teve um efeito, até relativamente ao ano passado, que nos surpreendeu do ponto de vista da eficácia. Foi uma decisão que nos dá um grande conforto do ponto de vista operacional, dá-nos também uma grande segurança em relação à decisão que tomámos, mas também permite que as nossas equipas – que muitas vezes quase funcionavam por reacção – sejam direccionadas para uma programação de trabalhos que antes não era feita, o que permite uma melhoria ao nível do nosso funcionamento.
É uma operação para continuar em 2019?
É uma operação que vamos continuar no ano de 2019, talvez se alargue a área do saneamento de águas residuais que merece toda a nossa atenção, entretanto vamos fazendo análises semestrais até atingir uma certa estabilidade nas operações em causa.
Estamos a falar de uma intervenção apenas na cidade ou em todo o concelho?
Em todo o concelho e em toda a rede. Naturalmente que a operação na cidade de Beja é maior, é onde há um maior número de ramais e de problemas. Neste momento estamos também a substituir ramais no Penedo Gordo, mas já o fizemos em outras localidades com Baleizão, Salvada, Cabeça Gorda, Quintos, Santa Vitoria, em todas… Aquilo que determina a nossa intervenção é o estado de funcionamento do ramal.
Estamos a falar de um investimento de que ordem?
Neste momento, já investimos cerca de 250 mil euros nesta operação com resultados supreendentes.
E até 2019? Qual é a previsão de investimento?
Vamos fazendo balanços semestrais, mas diria que poderemos duplicar o investimento se assim se justificar.
Na área dos grandes investimentos, quais as prioridades traçadas pela EMAS?
Estão identificadas desde há muito… Há uns anos atrás (mais uma vez, coincidência ou não, quando estávamos cá) fizemos a primeira grande intervenção que estruturou [a rede da] a cidade em três anéis diferentes em termos da distribuição de água e das pressões. O que estava desenhado era que outras zonas mais pequenas dentro desses anéis, em função dos problemas que tinham, tivessem uma remodelação integral.
Em que zonas? No centro histórico, por exemplo?
Quando falamos em zonas estruturadas numa rede de águas não podemos fazer essa distinção, pois são zonas que têm que ver com a própria rede de águas. O centro histórico, por exemplo, é influenciado por duas zonas da rede, uma delas mais prioritária que outra. É a essa estruturação que se devia ter dado continuidade. Mas a prioridade são as zonas mais antigas, onde ainda existem materiais menos recentes ou que apresentam maiores problemas. Há uma grande parte da zona que esteve eleita como prioritária no passado e que coincide com a parte da zona histórica, situação que se veio agravar com uma situação onde, mais uma vez, o poder político se veio imiscuir da pior forma possível nas decisões técnicas, que tem que ver com o derrube do reservatório da Praça [da República], que lá estava por uma razão. E contrariamente a tudo o que se disse, esse reservatório esteve sempre em funcionamento até à véspera da sua demolição. Era um órgão que permitia uma reserva de água para aquela parte da cidade e que criava um equilíbrio em termos de pressões que era importante.
Foi, portanto, uma má decisão demolir o depósito?
Do ponto de vista técnico foi uma péssima decisão! Foi uma decisão que não teve justificação técnica nenhuma, que teve um custo elevadíssimo – muito maior que a reabilitação que estava projectada na altura – e que veio agravar ainda mais os problemas que já existiam no centro histórico. E a prova disso é o que temos de resolver no dia-a-dia: o aumento de roturas e o aumento de interrupções de serviço.