Retrocesso Civilizacional

Quinta-feira, 3 Julho, 2014

Napoleão Mira

empresário

Estou na sala de espera de um ex-centro de saúde deste país. Agora, mais um depósito de doentes que têm de passar pelo calvário da burocracia para serem atendidos.
Como todos eles, espero e desespero por uma consulta de recurso. Para tal degladiamo-nos por uma senha milagrosa que nos há-de permitir a tal entrevista com o homem da bata branca.
O tempo que tenho de espera depois da senha conquistada, permite-me recuar no tempo e reflectir sobre o estado a que chegámos no que à saúde diz respeito.
Há muito que perdi o meu médico de família. Esse foi o primeiro sinal de que as coisas estavam a mudar. Depois, mesmo sendo portador de uma doença crónica, veio a árdua tarefa de tentar arranjar uma consulta, mesmo que apenas para pedir medicação. Isto para não falar das taxas penalizadoras, já que de moderadoras pouco ou nada têm, atendendo à qualidade do serviço prestado.
A saúde era um dos baluartes da revolução. Em 40 anos, tínhamos dado um salto qualitativo de que nos orgulhávamos de peito aberto. Não tínhamos salários iguais aos restantes europeus, mas, no que a este bem essencial dizia respeito, chegámos a pedir meças com os melhores.
A mortalidade infantil, outrora uma vergonha estatística, chegou a ser debelada. A esperança de vida não cresceu a olhos vistos, medrou sim a anos contados.
Agora, olho para estes meus companheiros de infortúnio e leio-lhes no vazio dos olhos a tristeza de quem, tal como eu, sentem na pele um inconcebível retrocesso civilizacional.

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