Os salvadores

Quinta-feira, 17 Setembro, 2020

Paulo Arsénio

eleito pelo PS - AM Beja

É evidente que os tempos que se vivem não são fáceis. Não o são para as famílias, não o são para as empresas, nem para o Estado quer a nível central, quer nas suas outras vertentes de carácter regional ou local.
Não estamos em contexto de crescimento e não se pode dar, ou prometer, tudo a todos. Quem o fizer estará a fazer populismo barato e utilizar argumentos que enfermam de alguma demagogia.
Porém, convenhamos também que o país está a esgotar a paciência com o grupo que venceu as últimas eleições, há menos de um ano recordo, e que se auto-designam por “salvadores”. Sim, “salvadores”, disse bem. Não raras vezes tenho visto membros do executivo ou deputados da maioria utilizar a expressão “estamos a salvar Portugal”. Deve ser a segunda expressão mais utilizada nos meandros do poder, logo a seguir ao já popular “Não somos a Grécia”!
Esta classe de “salvadores” tem uma particularidade que a distingue: andam todos com um crachá com a bandeira de Portugal na lapela dos seus casacos, numa outra atitude que já começa a irritar o comum dos cidadãos e que é própria de políticos norte-americanos e chineses, mas que não é utilizada na Europa.
À expressão “estamos a salvar Portugal”, esta classe dirigente associa sempre outra e que torna a primeira verdadeiramente preocupante e temida: “Custe o que custar”! Dentro desse “custe o que custar”, vai tudo a eito. O memorando da “troika”, com as costas largas, pede todos e mais alguns sacrifícios aos portugueses. Costas largas ou versão XXL, porque muitas das medidas anunciadas pelo actual executivo não constam sequer do dito memorando da “troika” e decorrem de vontade política interna.
O que se percebe é que as medidas já colocadas em prática ou que estão na forma, prontas a sair e a serem aplicadas, estão a conduzir à morte rápida das galinhas. Assim dificilmente haverá ovos no futuro.
Já é por demais evidente que tudo o que foi dito em campanha em Maio de 2011 não está a ser minimamente concretizado. E o que está, está a ser feito exactamente ao contrário do que tinha sido prometido.
Claro que não defendo a irresponsabilidade. Portugal deve cumprir o acordo que assinou para se financiar em 78 mil milhões de euros. Porém não se deve ir para além daquilo que são as nossas obrigações. É um acordo duro, que impõe sacrifícios a todos, mas que deixava espaço para que a economia respirasse ao contrário do que agora sucede e em que se asfixia tudo.
“Salvar Portugal, custe o que custar”.
Se o “custe o que custar”, significa mais de 15% de desemprego e continuar a crescer, devemos continuar a aceitar em silêncio?
Se o “custe o que custar”, significa um número recorde de empresas e de famílias a falirem e a serem atiradas para a miséria, devemos continuar a aceitar em silêncio?
Se o “custe o que custar”, significa a venda a retalho dos melhores activos públicos nacionais, devemos continuara a aceitar em silêncio?
Este caminho de asfixia, que começa no não financiamento e termina na insuportável carga fiscal, é o de liquidação da economia nacional. Este caminho, exclusivamente de austeridade e em doses sucessivamente reforçadas, fará com que os auto-denominados “salvadores” fiquem na história do país pelos piores motivos.
Por muito que todas as semanas novos números, novos dados, novos indicadores, vão desmentindo o sucesso desta receita que nos é apresentada como única para a salvação, o Governo, apoiado por inúmeros comentadores televisivos, insiste e insiste. “Custe o que custar”. “Salvar Portugal”.
Esta semana Miguel Relvas afirmou querer fazer os portugueses mais felizes. Alguém, com bom senso que lhe diga, por favor, que não está a ser bem sucedido nessa missão. Que o curso de “salvação” que está a ser aplicado se assemelha mais a um programa de afundamento colectivo. Ironia do destino, exactamente um século depois do mais famoso naufrágio da história da humanidade.
A continuar neste trilho estreito que, mais do que de imposição externa, resulta de uma verdadeira obsessão deste executivo, quem em breve precisará de ser salvo é o próprio Governo e alguns dos seus mais ilustres membros da bandeirinha na lapela.

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