Sempre vi nele um Bom Gigante, nome com que mentalmente o batizei e de que me lembrava sempre primeiro quando o seu, o verdadeiro, me atraiçoava a memória. O meu filho um dia chamou-lhe “O Melhor Empregado de Mesa do Mundo” e, entre os comensais mais ou menos fixos do Castro Restaurante, é assim que entre nós nos referimos ao José Lourenço.
Pela minha parte, até porque já fui mestre do mesmo ofício, sei apreciar os detalhes de uma profissão que, parecendo que é só carregar pratos de mesa em mesa, tem muito mais que se lhe diga, embora as etiquetas, maneirismos, gestos, silêncios e outros salamaleques estejam a cair em desuso, mesmo quando o serviço de alta qualidade já só se aplique numa reduzida percentagem de estabelecimentos.
No caso do José Lourenço, continua a aplicar e a ensinar os atributos da escola do bem servir, ao mesmo tempo que sabe ser prático sem ser desaprimorado. Um prodígio de equilíbrio entre o bem servir e o servir bem.
Costumo ficar a observá-lo de soslaio naquela dança entre mesas que distinguem os profissionais dos pretendentes a. Quero acreditar que lá no seu subconsciente há de ter um cardápio de coreografias dançantes para as diversas situações.
Sei que sabe ler no olhar dos clientes aquela impaciência comprometedora de quem está especado à espera de mesa. Um cumprimento especial aos mais conhecidos ou um sorriso de boas vindas aos novos clientes são de imediato traduzidos numa solução que, regra geral, agrada aos que demandam o Castro Restaurante. Ora arranjando uma mesa mais recatada para quem quer falar com mais discrição, ora tratando de colocar na mesa uns aperitivos para os que aparentam estar a definhar de fome. Em suma: é um regalo ver este homem desenvolver o seu mister com a segurança e o prazer de quem faz o que gosta.
Não sei muito da vida deste castrense. Sei que partilhamos o ano de nascimento (1956), que trabalhou fora durante anos e que não resistiu ao apelo chamativo das planuras. Ao encanto das manhãs feitas de sorrisos frescos e ao hipnótico dos mais belos entardeceres que o homem pode almejar.
Já foi estabelecido, mas há anos que trabalha no Castro Restaurante, onde me parece ser um profissional realizado e um homem feliz.
Há alguns meses teve um grave percalço de saúde que lhe ia acabando com o que lhe dá mais prazer: trabalhar para servir os outros.
Depois veio a pandemia, os estabelecimentos fecharam, outros já não voltam a abrir (como a mítica taberna do José Simões!). Novidades do amigo Lourenço soube-as há dias. Ia regressar ao ativo logo que o seu posto de trabalho fosse reativado.
Fiquei feliz por ele e por saber que aquele Bom Gigante de olhos cor de mar e sorriso franco, afinal, também é um guerreiro, um sobrevivente, um soldado, que prefere morrer no seu posto a definhar num qualquer banco de jardim ao som do baralhar das peças do dominó.
Muitos dos que o conhecem poderão achar exagerado o meu verbo. Eu prefiro pensar que o observo pelo ângulo que ele merece, mesmo que o próprio dele não se aperceba.
Bom Gigante, O Melhor Empregado de Mesa do Mundo ou José Lourenço são epítetos que lhe assentam como uma luva. Pela minha parte, para minha felicidade e dos outros comensais, pois que continuemos a usufruir da irrepreensível conduta própria dos predestinados, ou seja, apenas ao alcance do “Melhor Empregado de Mesa do Mundo”.
O autor utiliza o novo Acordo Ortográfico