Esforço e moral

António Sebastião

presidente da Câmara de Almodôvar

No Natal passado a Câmara Municipal de Almodôvar tomou uma medida relativamente aos seus trabalhadores, que me pareceu de grande bom-senso na aplicação dos recursos financeiros municipais, simultaneamente demonstrando uma preocupação de equidade social e também de preocupação para com o sector económico do comércio tradicional, que depois teve efeitos, praticamente, em todo o tecido empresarial local.
Esta medida, previamente discutida com os trabalhadores, teve a ver com a não realização do tradicional jantar de Natal e a oferta da habitual prenda aos trabalhadores, havendo uma oferta de um cheque-brinde a todos quantos trabalham para a Câmara Municipal, no valor de 100 euros, dividido em quatro fracções de vinte cinco euros cada uma a serem totalmente gastos no comércio tradicional local.
Assim aconteceu com grande acolhimento de todos os intervenientes e revelou-se num inegável êxito.
Esteve na sua base a tentativa de dar resposta a vários problemas que sentimos existirem na nossa comunidade e, naturalmente, no país.
Não podemos dar resposta ao país mas podemos fazê-lo, ainda que de forma parcial, em termos locais. E foi isso que fizemos:
– Primeiro, procurámos amenizar os efeitos do imposto extraordinário que uma parte substancial dos funcionários teve de pagar relativamente ao subsídio de Natal;
– Segundo, introduzir uma nova medida de equidade social, pois os trabalhadores que não foram afectados pelo pagamento desse imposto extraordinário têm salários muito baixos e, como é do conhecimento geral, também têm as suas posições remuneratórias congeladas, o que significa continuar com esses salários não se sabe até quando.
– Terceiro, ajudar o comércio local, através da injecção destas verbas, o que contribuiu para aumentar as suas vendas e, naturalmente, aliviar as grandes dificuldades que atravessa, não só pela crise que estamos a atravessar mas, também, pela concorrência fortíssima das grandes superfícies comerciais.
Em termos de teoria económica, os cerca de vinte mil euros disponibilizados para o efeito, e que foram obrigatoriamente gastos na economia local, acabaram por, de forma indutiva, ter um efeito multiplicador no volume de negócios de Almodôvar.
Tomámos esta decisão, que simultaneamente revela uma capacidade de definir prioridades e também uma capacidade financeira para o fazer. Neste ano de 2012, tão difícil, queremos construir uma almofada que pode amenizar os impactos dolorosos na vida dos nossos munícipes.
Como o iremos fazer, ficará para uma próxima crónica.
Mas o que pretendo com este relato da medida extraordinária que adoptámos no passado mês de Dezembro é chamar a atenção para a premência das políticas nacionais terem uma vertente de grande equidade social, de preocupação para com os mais desfavorecidos e que possam gerar energias positivas para o crescimento da nossa economia.
Sempre tenho defendido nas minhas crónicas as medidas de austeridade para cumprimento do memorando de ajuda externa que Portugal assinou, designadamente a redução do défice e o equilíbrio das contas públicas. Também tenho sempre defendido que os sacrifícios têm de ser equilibrados, proporcionais e que os que mais têm devem dar o exemplo. Não pode haver facilidades na aplicação dessas medidas.
Na minha opinião, recentemente houve uma série de fragilidades, não comprometedoras do êxito do caminho que temos de percorrer, mas que devem merecer a necessária atenção e reconhecimento dos erros e a sua correcção futura da parte dos nossos governantes e de instituições que desempenham um papel fundamental na vida económica e social do país.
Refiro-me, concretamente, às nomeações para o conselho de supervisão da EDP. Sabemos que a EDP, neste momento, é praticamente uma empresa privada, pois o Estado apenas detém uma parte mínima do seu capital social, e que, portanto, os membros do conselho são nomeados pelos accionistas, o que significa que o Governo nem deveria ter sido ouvido sobre essa matéria. Aliás, essa é também a versão oficial, mas é evidente que ninguém acredita e tratando-se das pessoas que vieram a lume, ainda menos. Assim, a bem da paz social e da credibilidade do Governo, penso que tudo isto deveria ter acontecido de forma distinta. Não está em causa a competência dos nomeados, mas antes os superiores interesses do país, os quais devem estar em primeiro lugar em todos os momentos.
Ainda nesta matéria, é preciso não esquecer os salários milionários, quer do anterior conselho, quer do recém-empossado.
O mesmo se passou com os administradores da holding do Estado, Águas de Portugal. Neste caso, os motivos do meu reparo são outros, mas o efeito na opinião pública foi o mesmo.
Também o caso peculiar dos trabalhadores do Banco de Portugal, que a coberto do seu estatuto especial, podem ficar de fora dos cortes nos subsídios de férias e Natal. Esta situação é tão mais grave quando falamos dos trabalhadores da instituição reguladora do sistema monetário português e que tem lançado sucessivos alertas ao executivo sobre a necessidade de cumprir metas de redução de despesa.
Em suma, em momentos de crise como a que vivemos e que não se avizinha passageiro, é de extrema importância que o poder político aplique medidas justas e equilibradas e, sobretudo que sejam claras e transparentes.
Só assim os cidadãos estarão dispostos a aceitarem os sacrifícios e a contribuírem para o relançamento de Portugal.

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