Terá dito (ou escrito, não sei) o filósofo e escritor espanhol Miguel de Unamuno – uma das figuras da intelectualidade espanhola que, nos anos Trinta do século passado, afrontou a ascensão do fascismo espanhol no pós-guerra civil defrontando publicamente o tristemente célebre autor dos gritos “<i>viva la muerte</i>” e “<i>muerte á la inteligência</i>”, general Millan-Astray – que “<i>yo no creo en las brujas, pero que las hay, las hay! </i>”. O dito, popularizado por esse mundo fora (707 000 citações no Google!), aplica-se que nem uma luva ao actual contexto político português. Seja qual for a evolução do caso Freeport (escrevo esta crónica a 1 de Fevereiro), é quase impossível o observador comum não fazer deste caso a ponte com outros casos bem conhecidos da opinião pública – o <i>affaire</i> BPN e o processo Casa Pia. É que, das duas uma: ou (hipótese que considero absurda e que utilizo apenas por rigor metodológico) José Sócrates é um louco desonesto acolitado por um bando de loucos desonestos que procuram enriquecer a qualquer preço e, neste caso, o episódio Freeport é apenas nada mais que um episódio (cadê os outros episódios do filme?) ou (hipótese que perfilho) tudo isto não passa de mais uma manifestação das maneiras “negras” de fazer política em Portugal, por parte de sectores que não hesitam em recorrer a tudo quando vêem os seus interesses ameaçados. Não me parece que tenha sido por acaso que, num momento em que a pressão política sobre a direita portuguesa, no consulado de Santana Lopes, atingiu um ponto muito significativo, que eclodiu o processo Casa Pia, decorrente de factos que, julgamos saber hoje, tinham tristes e longos anos de curso. Não me parece que tenha sido também por acaso que os entrefolhos do processo foram conduzidos no sentido de “liquidar” politicamente as duas personagens que mais poderiam ameaçar, no contexto político daquela altura, muitos interesses, legítimos uns, muito ilegítimos outros. Por entre os pingos desta chuva mandada chover, de cariz manifestamente político no pior sentido possível desta expressão, escaparam alguns dos supostos verdadeiros culpados, ao que circulou e circula em muitos mentideros… E, de caminho, prejudicou-se gravemente a carreira e a figura de um Paulo Pedroso ou de um Eduardo Ferro Rodrigues que, por mero acaso, constituiriam, se chegassem ao poder, ameaças significativas à manutenção de um status quo político (de muita conveniência para alguns) que reinava na altura. Em 2005, na altura em que já era claramente perceptível que o PS ganharia as eleições legislativas e o nome de Sócrates veio para a ribalta, logo eclodiram duas campanhas: uma, absolutamente primária e ultramontana, insinuando uma pretensa homossexualidade (como se as opções sexuais de cada um interferissem na adequação do seu perfil para o cargo a que se candidatava) e outra, mais elaborada mas, na altura, aparentemente mal construída, já relacionada com a construção do outlet de Alcochete, que foi rapidamente desmontada e que teve responsáveis identificados e, tanto quanto me lembro, até condenados. Mas, entretanto, muita água correu debaixo de muitas pontes e 2009 é ano de múltiplas eleições: a crise económica mundial teve as inevitáveis primeiras ondas em Portugal e veio pôr a claro aquilo de que, também, se suspeitava há muito – as jogadas ilegais de especulação financeira de alguma alta finança portuguesa, com ligações íntimas a alguns sectores políticos mais conservadores de primeira e segunda linha. Gente a quem convém nova cortina de fumo, tal como aconteceu em 2002/2003, que “esconda” o assunto e que permita uma reviravolta no quadro político geral. Posso estar muito enganado, mas cheira-me a que, ultrapassado, como espero, este pesadelo que desabou sobre Sócrates, muito boa gente vai entrar em pânico (imediato e a prazo) neste nosso querido país…
Não quero fazer processos de intenção a ninguém, mas se há silêncios que se compreendem e aceitam, outros há que são, até institucionalmente, ensurdecedores. Há muitas coisas que, neste mundo, acontecem por acaso. Mas outras não. Neste caso Freeport assumo que acredito mesmo em bruxas. Só gostava de saber quem são e onde estão…
<b>Uma segunda nota, para algo que não gostaria de deixar passar em branco</b>: o autarca de Sines, dr. Manuel Coelho, desvinculou-se do PCP, após 35 anos de militância, por incompatibilidade com a actual direcção partidária, acusando o partido de atitudes de, cito, “carácter retrógrado e reaccionário”. Nada que me admire, já o escrevi várias vezes nesta mesma página. Tudo se resume a uma questão de inteligência, como atentado à inteligência do leitor constitui a maneira como o “Diário do Alentejo” noticiou este mesmo assunto.