A história de vida de três baixo-alentejanos no Canadá

Francisco Pinto, Ilídio Francisco e José Valeriano nasceram em aldeias baixo-alentejanas, mas há décadas que vivem na metrópole de Toronto, a maior cidade do Canadá. Três histórias de vida, em que deixaram tudo para agarrar o “sonho canadiano”, relatadas na primeira pessoa ao “CA”.

A história de vida de três baixo-alentejanos no Canadá

Francisco Pinto (Entradas). “Não estava à espera de árvores a dar dinheiro”

Em 1956 eram muitas as dificuldades na vila de Entradas, no concelho de Castro Verde. Por isso, com poucas hipóteses de emprego e sem perspetivas de futuro, Francisco Pinto optou por deixar tudo para trás e rumar ao Canadá, numa decisão que mudou para sempre a sua vida.

“Não conhecia absolutamente nada, simplesmente algumas informações que vi em revistas e jornais. Mas como a vida em Portugal era muito má e não havia hipóteses de emprego, resolvi vir para o Canadá”, conta ao “CA” este emigrante, há 67 anos a viver em Toronto.

O que encontro do outro lado do Atlântico não desapontou Francisco Pinto. “Não esperava encontrar árvores a dar dinheiro, mas tive logo a ideia que o Canadá era um país completamente diferente, que o nível de vida não tinha nada a ver com Portugal e que era um país mais desenvolvido e com melhores condições de vida”.

Nos primeiros tempos, Francisco Pinto trabalhou na agricultura, mas pouco depois foi trabalhar para uma das maiores companhias de eletricidade do Canadá, ao serviço da qual viajou por todo o território do segundo maior país do mundo. “Fui evoluindo e ainda cheguei a um grau confortável”, conta.

Apesar de sozinho num país distante (a mulher só chegou mais tarde), este entradense reconhece que não teve “muitas dificuldades” em adaptar-se. “A alimentação era um bocadinho diferente, mas adaptei-me como facilidade e também aprendi umas palavritas em inglês depressa. E como era novo, comecei a conviver com os outros jovens e comecei a fazer a minha vida normal”, recorda.

Há já alguns anos que Francisco Pinto não vai a Portugal, que visitava quase todos os anos, não falhando a Feira de Castro. Mas apesar da distância, não esquece e a terra onde nasceu (e onde já não conta voltar).

“Tenho muitas memórias de Entradas e do Alentejo… Andei lá à escola e até aos 13,14 anos lidei por ali. Agora já não irei mais a Entradas, mas tinha lá família e gostava de ir a Entadas e ao Alentejo”, remata.

A história de vida de três baixo-alentejanos no Canadá

Ilídio Francisco (Aldeia dos Elvas). “Vim para o Canadá porque queria mais”

O ano da revolução em Portugal, 1974, foi também de viragem para a vida de Ilídio Francisco. Com pouco mais de 18 anos, este natural de Aldeia dos Elvas, no concelho de Aljustrel, fez a mala, deixou o seu emprego em Setúbal e rumou ao Canadá, em busca de uma vida melhor.

“Não necessitava de vir [para o Canadá], pois tinha um bom emprego na antiga SOCEL, mas queria mais para a minha vida”, explica ao “CA” Ilídio Francisco, de 68 anos, já reformado e residente na zona de Toronto.

Os primeiros tempos na metrópole canadiana foram exigentes. “Tive de começar tudo outra vez”, recorda este emigrante, que levou os primeiros três meses passados em solo canadiano a aprender inglês. “Assim que passei no exame, trabalhei sempre na parte elétrica”.

Foram 36 anos passados na General Motors, detentora de marcas como a Ford ou Chrysler. “Fazíamos lá todos os gadgets [instrumentos/ dispositivos em inglês], como ares-condicionados, sensores, toda a parte eletrónica”, conta Ilídio Francisco.

Com o passar do tempo, ainda pensou em montar uma empresa e trabalhar por conta própria. Acabou por não avançar, sem que se arrependa disso. “Tenho levado uma boa vida, cheguei a ganhar mais de 100 mil dólares por ano”, afirma.

Por isso mesmo, Ilídio Francisco já não pensa num regresso definitivo a Portugal, ainda que visite amiúde a família e tenha casa na zona da Comporta.

“Tenho aqui os meus filhos e os meus netos… Além do mais, sei das dificuldades que o país [Portugal] passa. Por isso, é aqui que vou ficar”, conclui.

A história de vida de três baixo-alentejanos no Canadá

José Valeriano (Semblana). “Não é fácil pensar num regresso a Portugal”

A vista a partir do local de trabalho de José Valeriano é privilegiada e das mais desejadas por todos os que visitam Toronto. Natural da pequena aldeia de Semblana, no concelho de Almodôvar, José Valeriano trabalha há cerca de uma década no restaurante da CN Tower, um dos símbolos da metrópole canadiana, com mais de 570 metros de altura.

“É um dos restaurantes mais altos do mundo. O serviço é um espetáculo e a comida é boa. Servimos 500 almoços e 900 jantares todos os dias, exceto no inverno, quando as temperaturas ficam muito baixinhas. Chegam aqui clientes de todo o mundo”, conta este emigrante ao “CA”.

José Valeriano nasceu há 63 anos e está no Canadá há 33, admitindo que não sentiu grandes dificuldades na adaptação a um novo país… com uma exceção. “Sou muito esquisito com a comida e quando cheguei cá não gostava de nada. Estamos habituados à nossa comida do Alentejo e depois cá nem o pão é igual”, confidencia.

Apesar de tudo, este almodovarense reconhece que as diferenças entre os dois países eram (e são) mais que muitas. “A economia de Portugal não tinha comparação com esta. Ainda hoje não tem”, afiança.

Hoje em dia, José Valeriano está totalmente integrada na sociedade canadiana, tendo mesmo sido proprietário de dois restaurantes antes de começar a trabalhar na CN Tower. Portugal e a sua aldeia de Semblana continuam no seu coração, regressando ao país “todos os anos”. “E de vez em quando vêm amigos meus de Portugal até cá”, acrescenta.

Mas quando chegar a altura da reforma, voltar à terra onde nasceu não está nas opções de José Valeriano. “Não é muito fácil pensar em regressar em Portugal a partir do momento em que temos filhos, depois vêm os netos… As minhas duas filhas nasceram cá e só gostam de ir lá de férias. Não será fácil regressar”, garante.

Partilhar

Facebook
Twitter
WhatsApp
Correio Alentejo

Artigos Relacionados

Role para cima