O presidente do conselho de administração da Caixa Agrícola de Aljustrel e Almodôvar, Orlando Felicíssimo, admite, em entrevista ao “CA”, que o momento atual da economia no país e no mundo exige algumas cautelas. Ainda assim, o gestor afiança que o setor bancário está hoje “mais forte do que estava” na anterior crise, em 2008-2009.
O atual clima económico e social motiva preocupações acrescidas?
É claro que sim e não seria realista responder de outra forma. A subida das taxas de juro é bastante significativa e pesa no orçamento das famílias. E não é só esse fator que vai pesar no orçamento das famílias… A subida generalizada dos preços, o crescimento da taxa de inflação e a subida do preço dos bens alimentares, que é uma componente que as pessoas não podem evitar, também. Todas as pessoas precisam de fazer a alimentação e sendo esses os bens que estão com taxas de inflação mais elevadas, a situação é até preocupante. Porque isso vai atingir transversalmente toda a gente e quem tem menores rendimentos acaba por afetar uma maior fatia do seu orçamento à alimentação e fica ainda numa situação mais frágil. A juntar a tudo isso, temos o contraponto de, para combater a inflação, os bancos centrais estarem a aumentar as taxas diretoras, o que vai fazendo com que a Euribor vá subindo e prevê-se que esta subida ainda continue por algum tempo. Obviamente que isso vai trazer dificuldades às empresas e às famílias, porque nem todos vão ter rendimento suficiente para conseguir acomodar tantos aumentos. E aqueles que mais o vão sentir são os que têm rendimentos mais baixos ou que estavam com taxas de esforço mais perto do limite.
Qual a vossa estratégia para esta nova realidade?
Aquilo que estamos a fazer é ter uma atitude preventiva, na medida do possível, e tentar prevenir algumas situações, dando instruções às nossas agências para tentarem falar com os clientes no sentido de renegociar, sempre que possível, ou estabelecer novas condições, de forma a que os clientes consigam cumprir com as suas responsabilidades. Porque é um facto que o rendimento das famílias não está a acompanhar a subida generalizada dos preços.
Os processos de renegociação de créditos têm aumentado substancialmente nos últimos meses?
Sim, têm… É quase inevitável e para as duas partes! É inevitável para o cliente e também é inevitável que os bancos tentem acompanhar esse processo. A última coisa que se pretende é que os clientes entrem em incumprimento.
“Nem todos vão ter rendimento suficiente para conseguir acomodar tantos aumentos. E aqueles que mais o vão sentir são os que têm rendimentos mais baixos ou que estavam com taxas de esforço mais perto do limite.”
Devido a esta crise, o volume de depósitos na Caixa de Aljustrel e Almodôvar tem diminuído? Há mais gente a recorrer às poupanças para fazer face ao aumento do custo de vida?
É normal isso acontecer e nestas alturas de crise há sempre algum consumo de poupanças para fazer face a estes tempos difíceis. Ainda assim, o crescimento das poupanças mantém-se e no ano anterior tivemos um aumento de recursos à volta de 5,5%, o que é positivo.
Estas dificuldades também já se notam nas empresas ou são, sobretudo, sentidas pelos clientes particulares?
É semelhante… Para as empresas está a ser também uma altura bastante difícil, porque o preço dos fatores de produção aumentou bastante. As empresas não estão imunes ao que se está a passar, muito pelo contrário. E depois são também obrigadas a aumentar os preços dos seus produtos. Portanto, a situação do lado das empresas não é muito diferente e poderão haver na mesma situações de alguma dificuldade.
As recentes notícias de falências de três bancos nos EUA podem deixar antever uma crise mundial semelhante à de 2008?
Quer-me parecer que a situação é diferente…
Porquê?
Hoje em dia, após a grave crise de 2008 que trouxe imensos problemas durante vários anos, foram tomadas várias medidas pelos bancos centrais, algumas das quais nos terão parecido na altura excessivas, mas o que é um facto é que hoje em dia a banca em geral está muito mais protegida do que estava nessa altura. Além do mais, e segundo o que tenho acompanhado, uma das instituições em questão era um banco com características um pouco diferentes da banca tradicional, que apostava muito em start-ups e noutro tipo de atividades empresariais, se calhar com maior risco. Portanto, não me parece que a situação seja similar [à de 2008]: nem pelo tipo de atividade e nem pelo reforço que houve ao nível da capitalização e da melhoria dos rácios de liquidez da banca. A banca hoje está mais forte do que estava nesse período.