Uma Tarde Em Marraquexe

Napoleão Mira

empresário

Aqui há tempos fui a Marraquexe. É claro que me internei na labiríntica medina, na esperança de me poder perder, por lá ou, em última hipótese, por algum objecto que me cativasse.
Depois de percorrer muitas das ruelas da medina, entrei numa loja de antiguidades.
Passeei os olhos pelo exposto e de repente reparo numa caixa que era a medida do meu desejo.
Abeirei-me do objecto apetecido e logo, como que por magia, um sorridente mercador beduíno se me dirigiu com o olhar de quem me desnudara o pensamento.
Agarrou a pequena caixa e começou a contar-me a história da mesma, não sem antes me dizer que esta, para que pudesse ser aberta, tinha um segredo, o que me levou de imediato a viajar para o reino de Ali Baba.
Era uma caixa muito antiga: tinha pertencido a um príncipe tuaregue que a tinha ofertado à sua amada como prova de amor.
Chegou-me a caixa ao nariz e perguntou-me se pelas minhas narinas ainda circulavam memórias olfactivas de tal moira encantada.
Nisto foi-se abeirando uma outra cliente que também foi bebendo da história. O nosso Mohamed deixou-se empolgar pelo relato e os seus gestos eram cada vez mais expansivos e teatrais.
A sua narração era agora um discurso de vendas muito bem elaborado. A minha atenção para com o Mohamed estava agora centrada na discussão negocial.
O árabe dizia-me que o preço não importava, pois situava-se algures entre a sua vontade de vender e o meu desejo de comprar, e logo que essas vontades se fundissem, estava encontrado o preço final, que poderia ser muito ou pouco, pois o resultado desses dois anseios é que condicionaria tal situação. Podia até acontecer que tais vontades jamais se encontrassem e assim num inchalah nos despediríamos como dois seres civilizados.
Agora, o importante, era entregar à pessoa correcta um legado único e antiquíssimo. Para tal, tinha de me mostrar merecedor de tal tarefa.
A coisa correu bem. Eu estava para lá de Bagdad, logo, fui genuinamente entrando no filme produzido, realizado e dirigido por aquele figurão das mil e uma noites.
As nossas vontades fundiram-se e foi finalmente encontrado o preço da transacção de tão precioso tesouro (não me recordo quanto!). Mohamed encarregou-se de embrulhar em papel pardo a minha nova aquisição e, enquanto eu lhe passava para as mãos os Dirams acordados, ele focava já a atenção na outra cliente, de nacionalidade inglesa, que insistia em querer adquirir a minha caixa.
Quase que estive para vender ali mesmo o meu suado tesouro, mas quando estava para entabular conversa com a senhora em questão, Mohamed levou em leque os dedos à fronte e com os olhos fixos no céu procurava uma solução para tão insólito problema.
De repente fez-se luz e o árabe rejubilando estalou os dedos e disse ter encontrado a solução. Afinal, parece que tinha outra caixa gémea desta que ali jazia embrulhada no tal papel pardo.
“Deves estar a brincar comigo?!”, perguntei-lhe. O árabe piscou-me o olho e encolhendo os ombros sorriu e disse: “É que eu tenho um primo que tem uma fábrica de antiguidades!”
Meti a viola no saco, fiz uma vénia, levei a mão em punho fechado ao lugar do coração, sorri e disse-lhe: “Que Alá esteja contigo!”

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