Tinha eu vinte anos quando votei pela primeira vez numas eleições autárquicas. No dia quinze de dezembro de 1985 eu vivia no Laranjeiro, concelho de Almada, e não conhecia nenhum dos candidatos. Não sabia quem eram, nem o que tinham sido até aí, nem o que pretendiam ser dali para a frente. Votei apenas e só alicerçado na opinião favorável que tinha de um determinado partido político e a partir desse dia, exercido o meu dever e o meu direito, nunca mais soube nada daqueles que eu escolhi, nem daqueles que ganharam, a terra era demasiado grande e eu acreditava, erradamente, que se devia deixar exclusivamente aos políticos o que é da política.
Nesse dia a Aliança Povo Unido ganhou as eleições com 49,52 % dos votos.
Nas eleições autárquicas seguintes, que se realizaram no dia dezassete de dezembro de 1989, eu já vivia de novo em Ourique, terra à qual entretanto voltara por absoluta necessidade existencial. Tinha regressado em 1988, cerca de um ano antes destas eleições, e, pela importância que atribuo a uma atenta interpretação da realidade que me circunda, já ia conhecendo melhor as pessoas e os partidos. Ainda assim, por não estar convencido relativamente aos atributos pessoais de cada candidato, fiz o mesmo que tinha feito e votei em nome de um partido.
Nesse dia a Coligação Democrática Unitária ganhou as eleições com 34,55 % dos votos.
Desde então realizaram-se mais sete eleições autárquicas, as pessoas foram mudando, os partidos foram mudando e eu fui mudando a minha perspetiva, deixei de votar por atacado, por seguidismo ideológico, afastei-me completamente de uma certa tribalização partidária, desloquei-me para mais longe para poder ver melhor, para poder votar melhor, para poder escolher melhor. Comecei a votar em pessoas, em equipas de pessoas, pelas suas propostas, pelos seus préstimos, pelas suas capacidades, pela sua entrega à comunidade, ora de um lado ora do outro do espectro partidário, cruzes diferentes, partidos diferentes, acreditando que os bons resultados só se alcançam através da dimensão humana e não através de um símbolo ou de uma bandeira.
Eis-nos chegados a setembro de 2021, às vésperas de novas eleições autárquicas que vão definir os destinos de cada comunidade para os próximos quatro anos. Na próxima terça-feira, dia 14 de setembro, começa a campanha eleitoral, um tempo que na nossa tradição política é muito apreciado por variadíssimas razões, uma das quais é porque os partidos e principalmente os candidatos acham que é aí que se vai resolver tudo, como se esses quinze dias fossem mágicos e ungissem pessoas e programas eleitorais.
Apesar de não valorizar muitos as campanhas por achar que elas não decidem grande coisa, irei estar atento aos programas eleitorais, muitas vezes apenas uma lista de desejos, aos debates para verificar da capacidade de argumentação e defesa de princípios, de memórias e de construção real do futuro, irei estar atento à elevação do discurso, ao respeito pelos adversários, se o que é prometido, se o que é dito sobre o passado, sobre o presente e sobre os anos que hão de vir não é um insulto à inteligência dos eleitores.
Completo trinta e seis anos enquanto membro ativo deste ato de cidadania. Mas por tanto tempo ter passado por mim e eu tanto tempo ter passado pela vida, já não olho para a política com a mesma cortesia e a mesma reverência de outros tempos. A Polis, a antiga organização social constituída por cidadãos livres que discutiam e elaboravam as leis para o bem comum de todas as pessoas, a base do nosso sistema democrático, tem vindo, nos tempos que correm, a perder um pouco do seu encanto.
No dia 26 de setembro irei votar outra vez, a minha terra merece que eu me preocupe e que escolha os que melhor representem os interesses das populações e que resolvam, sem demagogias, os problemas com que cada concelho se debate.
Aqueles que, em conjunto com a perceção que eu tenho deles, se os conhecer, evidentemente, me conseguirem garantir que a situação vai melhorar, não basta a lista de desejos, que posso acreditar nas suas propostas, nas suas equipas, no seu espirito de missão, que o saneamento básico melhorará, que a limpeza da vilas e das aldeias melhorará, que se vai apostar na cultura e na educação como fatores de desenvolvimento pessoal e social, que o concelho e as freguesias são homogéneos em termos de coesão territorial, que se vai investir nos espaços de lazer, que se vão criar centros e mecanismos de desenvolvimento económico, que se vai de uma vez por todas fazer o que ainda não foi feito e é primordial fazer, que o curto prazo eleitoralista nunca se sobrepõe ao longo prazo estrutural, que se conhece o assunto de que se fala sem dizer alarvidades, aqueles que me provarem que são críticos e equidistantes relativamente ao partido que os suporta e que os interesses dos eleitos nunca estarão acima dos interesses dos eleitores terão o meu voto.
E já que estamos em altura de promessas, eu também deixo aqui uma. Prometo que já não vou fazer como fiz no Laranjeiro, exercido o meu dever e o meu direito, vou estar muito atento àqueles que ganharam, a terra é muito pequena e eu acredito, convictamente, que não se deve deixar exclusivamente aos políticos o que é da política, principalmente a autárquica.
Venho aqui propor a criação de uma lista de cidadãos que querem e vão estar atentos.
Aceitam-se assinaturas a partir do dia 27 de setembro de 2021.
Nota importante: Guarde os programas eleitorais para poder ir comparando à medida que os mandatos vão decorrendo.