O pónei branco com melas acastanhadas da Associação Equestre Aljustrelense mal se mexe enquanto é escovado por Mehdi. De rosto fechado, o jovem francês vai passando com cuidado a escova pelo dorso do pequeno animal, deixando cair grandes tufos de pelo no chão. A tarefa dura uns bons cinco minutos até Mehdi parar repentinamente e entregar a escova à técnica. “Já está?”, questiona de imediato, num tom de voz suave e tranquilo, a professora, que perante a confirmação do jovem com um subtil de cabeça sugere irem os dois “fazer um desenho”.
Mehdi tem autismo e estuda no Colégio Internacional Joseph Vernier (CIJV), na cidade francesa de Nice. Nunca tinha saído de França sem a presença da família e raramente comunica com quem está em seu redor. Mas os últimos dias passados na vila de Aljustrel, a mais de 1.800 quilómetros de casa, têm sido muito diferentes. Para melhor!
“O Mehdi, nunca fala e ontem [segunda-feira, 24] começou a falar. O Mehdi não se veste sozinho e ontem começou a fazê-lo. Para nós, parece que não é uma coisa muito difícil de fazer, mas para ele é uma conquista enorme”, confidencia ao “CA” Cândida Rezio, professora de Português no CIJV.
A docente, natural de Ferreira do Alentejo mas há muito residente em França, lidera a comitiva de 10 alunos “especiais” (dois dos quais com autismo e os restantes com outros tipos de perturbações, como dislexia) e cinco técnicos do colégio francês, entre professores, auxiliares e uma enfermeira, que tem estado ao longo desta semana na vila de Aljustrel, participando em ações de terapia com cavalos.
“É cada vez mais claro que este tipo de atividade tem muitos aspetos positivos para este tipo de meninos e isto dá-nos mais vontade ainda de continuar a apostar nesta área”, afirma Marisa Góis, da Associação Equestre Aljustrelense
A visita, que termina neste sábado, 1 de março, resultada de uma parceria do CIJV com o Agrupamento de Escolas de Aljustrel, no âmbito do programa internacional Erasmus+, e com a Associação Equestre Aljustrelense, tendo o apoio da Câmara Municipal de Aljustrel.
“No CIJV estamos acreditados como parceiro Erasmus há dois anos e temos um dispositivo especializado em crianças ‘especiais’, em que uma das metas é a inclusão dos alunos, particularmente deste tipo de perfis, para incluí-los melhor na escola e na sociedade”, explica Cândida Rezio.
Segundo a docente, foi nesse âmbito que a direção da escola sugeriu a realização de uma experiência desta natureza para estes jovens. O facto de um familiar seu trabalhar na Associação Equestre Aljustrelense, levou Cândida a propor uma viagem até Aljustrel, imediatamente aceite.
“Em França é mais complicado aceder a este tipo de atividades, que são muito caras”, justifica a professora, indicando que a mais-valia deste projeto é, “desde logo, ser a primeira vez que [estes alunos] saem em viagem escolar para fora de França e conviverem juntos durante uma semana”.
“Isso ajuda muito ao desenvolvimento da criança, contrariamente ao que poderíamos pensar”, argumenta Cândida Rezio, considerando que tudo isto permite aos jovens “adquirirem confiança e autoestima”. “Sei que irão partir daqui com uma mais-valia a nível do seu desenvolvimento pessoal em geral”, afiança ao “CA”.
A presença dos alunos franceses em Aljustrel resulta de uma parceria do CIJV com a Associação Equestre Aljustrelense (AEA), que há cerca de uma década desenvolve atividades de terapia com recurso a cavalos, nomeadamente sessões de hipoterapia ou de equitação terapêutica.
“Sei que [estes alunos] irão partir daqui com uma mais-valia a nível do seu desenvolvimento pessoal em geral”, afiança a docente Cândida Inverno Rezio, do Colégio Internacional Joseph Vernier, de Nice (França)
Para Marisa Góis, da direção da associação, a iniciativa desenvolvida ao longo desta semana, em que os alunos franceses se juntaram a crianças portuguesas, acaba por “dar mais força” para a AEA continuar “a trabalhar nestes serviços”.
“É cada vez mais claro que este tipo de atividade tem muitos aspetos positivos para este tipo de meninos e isto dá-nos mais vontade ainda de continuar a apostar nesta área”, afirma ao “CA”.
Segundo Marisa Góis, este tipo de ações de terapia com recurso a cavalos “trabalha a parte da autoestima e da confiança” destes jovens, além de melhorar os seus “aspetos físicos a nível de postura e coordenação de movimentos”.
Este trabalho, continua a responsável, tem vindo a ser dinamizado há alguns anos pela AEA junto da comunidade estudantil do concelho, no âmbito do projeto “Sucesso Escolar”, em que associação, Câmara Municipal e Agrupamento de Escolas “se juntaram no sentido de proporcionar atividades mais diferentes e adequadas a este público”.
“No fundo, queremos ajudá-los a adquirir determinadas competências que, de outra forma, poderia ser mais difícil”, conclui Marisa Góis.