O aumento de casos de Covid-19 na região está a “pressionar” os serviços do hospital de Beja e os seus profissionais de saúde, que estão “exaustos”, garante o director clínico da ULSBA. Em entrevista ao “CA”, José Aníbal Soares refere que esta situação é “resultado” do comportamento das pessoas “durante o Natal e o fim de ano”.
Com os casos de Covid-19 a aumentar na região (e no país), em que situação se encontra o hospital de Beja e a sua capacidade de resposta?
O quadro continua muito complicado, porque continuamos com uma demanda muito grande de doentes. E estamos a tentar resolver diariamente tudo aquilo que é necessário resolver, procurando dar o melhor que podemos aos doentes. Neste momento estamos a fazer algumas alterações para ver se conseguimos dar uma resposta maior aos doentes Covid.
A que se deve este aumento de casos?
Isto é tudo resultado daquilo que foi o comportamento das pessoas durante o Natal e durante o fim de ano. E esperemos que as pessoas tenham um bocadinho de consciência de que o confinamento deve ser mesmo confinamento. As pessoas não acreditam, mas continuo a dizer: temos cada vez mais pessoas mais novas e em situação mais grave internadas. E volto a dizer: isto é, nem mais nem menos, o resultado do comportamento das pessoas. Por isso chamo a atenção das pessoas para que cumpram. As pessoas estão cansadas de estar fechadas em casa, mas os profissionais de saúde estão exaustos! E isto é muito mau, pois tudo é finito. Mas se as pessoas respeitarem aquilo que são as indicações, o uso de máscara, o distanciamento , a lavagem das mãos, o ficar em casa o máximo de tempo possível e virem única e simplesmente à rua para aquilo que é indispensável, isso ajuda-nos.
Houve na passada semana um reforço de camas em enfermaria e cuidados intensivos para doentes Covid. Estão todas ocupadas de momento?
Sim, está tudo ocupado. Por isso disse que estamos a tentar reorganizar-nos entre doentes mais ligeiros e doentes mais graves. Vamos tentar fazer com que exista uma certa diferenciação, porque os doentes mais graves são aqueles que necessitam de mais cuidado e mais apoio, quer médico que de enfermagem. Os menos graves são aqueles a que, ao fim e ao cabo, podemos não dar tanta atenção, pois são doentes ligeiros, que têm os seus critérios de internamento mas não estão a necessitar de terapias de oxigénio, de auto-refluxo ou ventiladores. E estamos a tentar readaptarmo-nos, porque isto é uma batalha diária e cada dia está a ser mais difícil e mais complicado. Ou seja, vamos andando como todos os hospitais deste país estão a fazer. Uns estiveram mais de descanso, outros menos, mas agora está tudo numa situação de subida [de casos] e é triste vermos as estatísticas e verificarmos que a maior percentagem de infectados neste momento ocorre entre os 16 e os 40 anos.
Isto é uma batalha diária e cada dia está a ser mais difícil e mais complicado.
Já foram obrigados a transferir doentes para outras unidades hospitalares por falta de camas?
Transferimos ontem [segunda-feira] dois doentes para Portimão. Essas duas camas foram imediatamente ocupadas e agora estamos a ver se temos doentes com condições de terem alta clínica para poderem sair. Mas é evidente que se tivermos – como qualquer outra estrutura hospitalar – uma demanda muito grande num momento muito curto, aí sem dúvida que, como qualquer estrutura, colapsamos. Veja-se o caso das pontes: aguentam um determinado peso, mas se pusermos lá peso a mais elas colapsam. É exactamente o mesmo que se passa em qualquer unidade de saúde deste país.
Como é o caso de Beja.
A pressão está a ser muito grande e está tudo a ser muito complicado! Mas de qualquer das maneiras, por enquanto – e pelos profissionais que temos –, estamos a tentar resolver tudo. É claro que tudo isto tem contrapartidas. E a contrapartida é que os nossos profissionais cada vez estão mais exaustos, cada vez veem menos as suas famílias… E também chegamos a uma altura em que queremos pensar e não conseguimos.
Isto é tudo resultado daquilo que foi o comportamento das pessoas durante o Natal e durante o fim de ano. E esperemos que as pessoas tenham um bocadinho de consciência de que o confinamento deve ser mesmo confinamento.
Casos de ambulâncias em fila, à espera de vaga nas Urgências, também já se verificaram no hospital de Beja?
Isso ainda não sucedeu, porque arranjámos uma estratégia para os lares. Logo no início, para os lares onde existiam surtos arranjávamos uma equipa médica e de enfermeiros, que iam verificar todos os utentes desse lar, iam ver aqueles que provavelmente iriam necessitar de cuidados e logo aí fazíamos uma triagem. O que acontece é que diariamente seguíamos e tínhamos profissionais nos lares a vigiar e a controlar tudo isso. Isso fez com que não houvesse grande demanda dos lares para o hospital, porque nós controlámos a montante. Agora, se de um momento para o outro surgir uma situação em que venha muita gente em simultâneo, é claro que não existe resposta imediata.
Vão aumentar o número de camas para doentes Covid?
Neste momento não temos espaço físico para isso. Estamos é, em conjunto com as outras autoridades, a tentar arranjar áreas – como já tivemos na Base Aérea – e a ver qual é a melhor forma de o fazer. E muito provavelmente serão situações que, caso seja necessário, iremos com essas entidades espoletar e a partir daí ficaremos com mais camas de internamento. Mas atenção: mais camas de internamento implicam mais profissionais. E aqui são sempre os mesmos… Tivemos um ligeiro aumento em enfermeiros nestes tempos, mas ao outro nível tudo se mantém tal e qual. Não tivemos um aumento de pessoal médico, não tivemos aumentos de assistentes operacionais… Ao fim e ao cabo, temos de dar apoio mas temos de puxar conforme o tamanho da “manta”.
Em virtude desta pandemia, em que ponto está aquela que é a actividade normal do hospital?
Há determinadas áreas em que não parámos, como o hospital de dia [para doentes oncológicos]. Do ponto de vista cirúrgico, até ao final do mês – e seguindo a nota do Ministério da Saúde – parámos com as cirurgias programadas. Mas se houver um doente muito prioritário que tenha de ser operado, ele será operado, assim como todos os urgentes, evidentemente. A nível de consultas, reduzimos as mesmas àquilo que são os prioritários. Na Saúde Mental continua a haver acompanhamento, da mesma maneira que foi reduzido – a nível hospitalar e não nos centros de saúde – a actividade de certas técnicas de diagnóstico e a fisioterapia. Neste momento, apenas estão a ser feitos os tratamentos prioritários dentro do hospital, sendo que como temos muito mais doentes respiratórios esses técnicos de fisioterapia estão a trabalhar no internamento para reabilitar o mais depressa possível esses doentes.