Autarca Mário Tomé diz que “Mértola também tem necessidades de água igualmente graves”

Em entrevista ao “CA”, o presidente da Câmara de Mértola, Mário Tomé, explica as razões que levam a autarquia a exigir mudanças no projeto de captação de água na zona do Pomarão para abastecer o Algarve.

A Câmara de Mértola tem-se oposto a este projeto de captação de água no Pomarão. Apenas porque não contempla o abastecimento das aldeias do concelho ou também por outras razões?

O Município de Mértola nunca esteve contra uma solução de abastecimento público à região do Algarve. O que é necessário entender é que o concelho de Mértola também tem necessidades igualmente graves e não estão salvaguardadas. A posição do município não está concentrada no ponto único da falta de abastecimento às aldeias do margem direita do rio Guadiana, está sim na necessidade de justiça, equidade e igualdade entre regiões. É inconcebível que as condutas adutores tenham como trajeto aldeias que são abastecidas por autotanques em grande parte do ano e que o seu abastecimento nem seja equacionado. É incompressível para nós, tal como é para quem vive nestes locais. Mas não são apenas estas questões de abastecimento. Precisamos de conhecer o projeto pormenorizadamente e avaliar os seus vários momentos, para que haja consenso nas soluções propostas.

Apesar da vossa contestação e das críticas da CIMBAL, a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) deu parecer favorável, ainda que condicionado, ao projeto. Que comentário lhe merece esta decisão?

São pareceres diferentes! A APA também revela as nossas preocupações e daí o parecer favorável condicionado. É extremamente importante que os modelos de gestão da exploração das captações assegure o regime de caudal ecológico real e que mantenha o equilíbrio do sistema. E é aí o ponto mais importante e que iremos fazer de tudo para salvaguardar esta realidade. Contudo, não é menos verdade que o rio Guadiana necessita de outras intervenções. A reabilitação das margens do rio Guadiana entre Mértola e Pomarão é essencial para melhorar a navegabilidade do rio, que atualmente é prejudicada pelo assoreamento progressivo causado pelo excesso de sedimentos acumulados desde o encerramento das comportas do Alqueva, em 2002, que impede que o leito natural do rio realize a sua regeneração natural. E essa posição também foi transmitida à APA e à tutela.

O Ministério do Ambiente e Energia solicitou, no final de julho, à APA um plano para garantir o abastecimento público regular de água potável à freguesia do Espírito Santo. Tem o município conhecimento de algum desenvolvimento relativamente a este processo?

Neste momento, sabemos que o estudo está a ser desenvolvido e aguardamos a proposta para posterior análise.

“É inconcebível que as condutas adutores [do projeto de captação de água no Pomarão] tenham como trajeto aldeias que são abastecidas por autotanques em grande parte do ano e que o seu abastecimento nem seja equacionado.”

Tem havido (ou vão haver) contactos/reuniões entre o município e o Governo ou outras entidades ligadas ao setor sobre esta matéria?

A comunicação tem acontecido. Não só através das reuniões já realizadas, que resultaram na tomada de posição da ministra Maria da Graça Carvalho, onde solicitou à APA o plano para o abastecimento público à freguesia do Espírito Santo e a recuperação das margens do Guadiana entre a vila de Mértola e a localidade do Pomarão, como irão ocorrer nas próximas semanas mais reuniões sobre o tema.

Quais vão ser os próximos passos da Câmara de Mértola relativamente a este projeto?

Como já referi, vamos estar a acompanhar o processo de perto e manter o calendário de reuniões com as entidades competentes para salvaguardar os interesses de Mértola.

Como avalia o princípio de acordo que os governos de Portugal e Espanha selaram, no final de setembro, que possibilita avançar com o projeto português de captação de água na zona do Pomarão, para abastecimento ao Algarve?

Era uma situação que se arrastava há demasiado tempo. Em primeiro lugar, nem era justo para o país a situação corrente, mas embora sejam salvaguardados os interesses de Portugal, também é necessário salvaguardar os interesses das regiões. Vejamos: no mesmo local onde é realizada uma tomada de água para o regadio da região da Andaluzia – que até ao acordo nem se conhecia exatamente a quantidade que era extraída do rio – poderá nascer outra para abastecer o Algarve. É positivo o acordo que regula esta tomada de água, até pela necessidade de conhecer de forma credível a salubridade do rio, mas não basta. É importante que as entidades competentes acompanhem o processo, pois esta extração poderá colocar em causa o rio Guadiana como o conhecemos, o que aliado à subida do nível da água do mar poderá mudar radicalmente a fauna e flora. Se antes não eram os conhecidos os dados exatos, agora já é possível e assim realizar este acompanhamento tão necessário neste curso de água.

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Correio Alentejo

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