“Almodôvar foi das câmaras com maior volume de ajudas durante a pandemia”

Em entrevista ao “CA”, o presidente da Câmara de Almodôvar, o socialista António Bota, faz um balanço do processo de transferência de competências, traça um retrato do quadro financeiro da autarquia e revela o ponto de situação de alguma das empreitadas projetadas.

Como tem corrido processo de transferência de competências do Estado para a Câmara de Almodôvar?

Aceitámos logo que pudemos essas competências, porque parte daquilo que estamos a fazer agora com a competência já fazíamos anteriormente. Sobre a Educação, aquilo que na minha opinião corre mal é o envelope financeiro. Depois, há uma questão relevante, que é poder vir o envelope financeiro, mas depois existem detalhes que custam dinheiro e não estão incluídos.

Quais?

Na questão da Educação veja-se a ADSE. Recebemos o envelope financeiro para os nossos funcionários para pagar os ordenados, mas depois qualquer despesa que a ADSE não comparticipe tem de ser paga pela instituição. Relativamente às novas competências assumidas agora na Ação Social, acontece quase o mesmo. Recebemos um envelope financeiro a rondar os 27 mil euros, que permite pagar a um técnico superior e um assistente. Mas depois temos o mesmo problema, ou seja, quando é necessário fazer um pagamento extra não temos condições. E depois recebemos 3.000 ou 4.000 euros para apoios sociais. Se fizermos bem as contas, esse montante não chega sequer para um mês de apoios. Mas a Câmara [de Almodôvar] já tinha apoios sociais – gastamos todos os anos cerca de 100 mil euros em apoios diretos a famílias carenciadas – e vamos continuar a ter.

Em entrevista na última edição do “CA”, o secretário de Estado Carlos Miguel anunciava que o “envelope financeiro” a transferir pelo Estado para as autarquias iria ser revisto, sobretudo nas áreas da Saúde e Ação Social. Isso deixa-o mais tranquilo?

Naturalmente que sim e a resposta do [secretário de Estado] Carlos Miguel só podia ser essa! Se há queixas dos autarcas, que dizem que as competências são bem-vindas mas o envelope financeiro não é suficiente para as necessidades atuais e vindouras, da parte do Governo só tem de existir abertura para resolver o problema.

Como caracteriza a atual situação financeira da Câmara de Almodôvar?

Estamos bem, apesar de termos tido em 2021 um resultado líquido negativo de 700 mil euros. Foi a primeira vez que aconteceu, mas também foi a primeira vez que tivemos dois anos seguidos de pandemia, com uma redução extrema nas receitas. Ainda assim, terminamos o ano com 1,8 milhões de euros de saldo positivo, que transitou para 2022. Mas sublinho que em 2021 tivemos mais despesas e menos receitas, em virtude das isenções que demos à comunidade e da aposta na manutenção da economia local. Tivemos dois programas, o PATECA 1 e o PATECA 2, que motivaram os nossos empresários e que representaram um investimento de cerca de 450 mil euros a fundo perdido. Também tivemos um apoio ao empreendedorismo superior a anos transatos, no valor de cerca de 170 mil euros, precisamente para estimular a economia. E mantivemos os apoios a estudantes, aos seniores, à natalidade, à compra de livros escolares, comprámos computadores para que todos os alunos pudessem estudar a partir de casa… Portanto, não deixamos de fazer o trabalho da Câmara Municipal apesar da redução bastante significativa – cerca de 30% – das nossas receitas. Claro que isso refletiu-se no resultado líquido de 2021! Mas quando as pessoas precisaram da Câmara financeiramente, estivemos lá! Talvez tenhamos sido a câmara do Baixo Alentejo com maior volume de ajuda à comunidade [durante a pandemia da Covid-19], especialmente aos empresários.

“Ou o Governo ajuda e entra aqui com mais financiamento para as autarquias ou daqui a um ano estamos todos em planos de recuperação financeira, com exceção de meia dúzia de municípios.”

Este ano as despesas dos municípios também são maiores, dado os aumentos na energia e nos combustíveis. Defende, como outros autarcas, que o Governo seja sensível a esta questão e, através do Orçamento do Estado, aumente as transferências para os municípios?

Isso é necessário e urgente! O nosso orçamento municipal, bem como todos os outros, só vai chegar ao fim do ano se cortarmos nas obras públicas. Se não cortarmos nas obras públicas não temos dinheiro que chegue para aguentar as despesas correntes da autarquia! Nem nós nem praticamente nenhuma autarquia no país, salvo algumas exceções no litoral. O problema que temos é que preparámos um orçamento com base na média [dos custos] dos últimos cinco anos e este ano tudo subiu [de preço] 30 a 40%. Os preços dispararam de forma exorbitante e não conseguimos chegar ao fim do ano se não cortarmos em obras planeadas. É impossível!

Ou seja…

Ou o Governo ajuda e entra aqui com mais financiamento para as autarquias ou daqui a um ano estamos todos em planos de recuperação financeira, com exceção de meia dúzia de municípios.

Almodôvar tem o maior orçamento de sempre em 2022, com muitas obras em “carteira”. No caso da nova creche, qual o ponto de situação?

Estamos a acabar de preparar o nosso projeto, que está atrasado cerca de um ano, mas não podemos esquecer que durante todo um ano os projetistas estiveram parados. Mas a obra do loteamento em que a creche vai ser incluída vai também começar brevemente, portanto estamos convictos que mais dois anos temos a creche pronta.


E o projeto de requalificação da EB 2,3/ Secundária Dr. João de Brito Camacho?

Estamos com problemas como todos estão… É que temos uma candidatura aprovada em que o custo de referência da obra não chega nem para pagar metade do valor real. Não há hoje construção civil a menos de 1.000 euros por metro quadrado, enquanto o custo de referência para a escola ronda os 450 euros. O projeto da escola está nos últimos “retoques”, sendo dividido em três fases e tendo passado de um orçamento que rondava os três milhões [de euros] para cinco [milhões de euros]. E nós temos um financiamento aprovado de cerca de um milhão de euros, ou seja, ainda precisamos de mais quatro milhões. Portanto, vamos esperar que o [programa operacional] 20/30 nos dê aqui uma “mãozinha” e que possamos continuar a trabalhar no projeto, que irá estar pronto antes do primeiro semestre terminar. Depois é esperar que existam avisos [de financiamento].

“Vou agora iniciar um abaixo-assinado junto da comunidade local e envolvente para que o assunto [construção de barragem na ribeira de Oeiras] seja debatido na Assembleia da República.”

Em curso estão as obras de requalificação do Campo das Eiras. Conta inaugurar o espaço com a edição de 2022 da FACAL?

A obra está quase terminada, mas não conseguimos que seja a tempo da FACAL. A feira vai voltar este ano, em que celebra o seu 25º aniversário, ao seu “ponto de origem”, ou seja, entre a Biblioteca Municipal e a Casa do Povo. É pena que não seja possível [utilizar o novo Parque de Feiras], pois estava tudo planeado para isso. Mas a escassez de materiais causada pela Covid-19 e pela guerra na Ucrânia veio criar ainda mais problemas, pois levamos cerca de um mês a esperar por materiais que, normalmente, qualquer fornecedor tinha em stock. Por isso, devemos acabar a obra lá para agosto/ setembro, em vez de a acabarmos em junho, como tínhamos planeado.

A economia local depende muito da atividade mineira. O projeto ZEP da Somincor deixa-o mais tranquilo relativamente ao futuro?

Com certeza que sim! Este projeto da Somincor vai permitir a continuidade da mina e Almodôvar vai beneficiar muito com isso.

Qual o ponto de situação da nova ZAE de Gomes Aires?

Penso que ainda semana vai sair, finalmente, em Diário da República, a aprovação do Plano de Pormenor (PP) para aquela área de acolhimento. Antes disso, não podíamos fazer nada, nem sequer tocar numa pedra. Mas assim que saia o PP, vamos iniciar imediatamente procedimentos de contratação para começar a trabalhar […], para ver se conseguimos lançar a obra ainda neste ano ou, se calhar, no próximo.

Esteve na Ovibeja com a ministra da Agricultura. Teve oportunidade de falar com Maria do Céu Antunes sobre a construção de uma barragem na ribeira de Oeiras, que você defende e reivindica?

Claro que falei e ela disse-me que temos de falar sobre o assunto e encontrar um caminho. Vou agora iniciar um abaixo-assinado junto da comunidade local e envolvente para que o assunto seja debatido na Assembleia da República. Todos os anos temos falta de água, já olhamos para a chuva como algo excecional e precisamos de reservas de água. Os ministérios do Ambiente e da Agricultura não gostam de ouvir a palavra “barragem” e por isso talvez tenhamos de ir ao dicionário encontrar um sinónimo. Mas o que é um facto é que, quando há falta de água, é através das barragens que se faz o controlo e – chamemos-lhe o que quiserem chamar – continuam a ser o referencial para sabermos se temos água ou não para as populações e para a agricultura.

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