O jovem treinador Gonçalo Pereira, natural de Castro Verde, acaba de se sagrar campeão da 2ª Liga da Finlândia e de subir ao principal escalão daquele país ao serviço do FC Lahti. Em entrevista ao “CA”, o técnico assume que tem a ambição de chegar ainda mais longe.
Qual é a sensação de ser campeão nacional, neste caso da 2ª Liga da Finlândia, ao serviço do FC Lahti?
[risos] A sensação, sinceramente, foi de alívio e de ter saído aquela pressão de cima dos ombros. Obviamente que foi o culminar daquilo que andámos a tentar fazer o ano todo e até senti a adrenalina a sair do corpo. Estou muito contente por ter atingido isso, mas também por ter proporcionado ao clube e a muita gente que lutou ao nosso lado um bom momento. São momentos que vão ficar guardados para sempre na memória de quem os viveu, porque, de facto, o FC Lahti não é um clube de 2ª liga. O clube tem que estar na 1ª liga e conseguir devolver o clube onde ele merece estar logo no primeiro ano, depois de terem passado um período menos positivo, foi bastante importante.
Ou seja, a subida estava nos objetivos da equipa? Era uma meta assumida?
Sim, era uma coisa que o clube queria. Como disse, o FC Lahti é um clube de 1ª liga, não há dúvidas disso. Nos últimos anos não têm estado muito bem e o plano a três anos, traçado quando estivemos em negociações e em reuniões o ano passado, é muito ambicioso. Este foi o primeiro passo e era uma coisa que queríamos muito, para dar também algumas bases ao projeto. Mas nunca é uma coisa fácil, porque a 2ª Liga da Finlândia [Ykkösliiga] é bastante competitiva.
E agora já estão a preparar a temporada de 2026? Qual é o próximo “passo” nesse plano a três anos?
Sim, já estamos a preparar, a arrumar a casa – como costumamos dizer – e em negociações com aqueles que queremos manter antes de sairmos para o mercado. Também estamos atentos ao mercado, mas, sinceramente, acho que mais para o final de novembro, início de dezembro, é que o mercado vai começar a mexer mais. E estamos a fazer algumas alterações também de estrutura, para ver se conseguimos ter uma estrutura ainda mais profissional, porque o objetivo para a segunda época é ter uma época tranquila, se possível conseguir chegar ao “top 6”, que é uma coisa bastante ambiciosa.
O João Pires vai continuar na sua equipa técnica?
Sim, claro que sim!
Está no estrangeiro há algum tempo, com passagens por Noruega, Suécia, Letónia, agora a Finlândia… Como é que têm sido estes anos e como é que tem sido esta experiência?
Em termos pessoais, acho que tem sido de uma evolução gigantesca. Consegui sentir isso logo no primeiro ano em que saí. Tem sido muito bom e vai de encontro àquilo que eu queria. Não queria estar envolvido durante muito tempo em equipas de camadas jovens e em escalões mais baixos, queria poder ser profissional desde cedo. Tive uma oportunidade há 10 anos de me tornar profissional como treinador de futebol e assim foi. São muitas histórias, alguns países, tem sido muito enriquecedor a nível pessoal, sem dúvida, a nível profissional também. É certo que as coisas não têm sido só “rosas”, mas a minha carreira tem corrido bastante bem e, acima de tudo, tem sido uma grande aprendizagem do ponto de vista pessoal e profissional, para me preparar para aquilo que pode ser o futuro da minha carreira.
O que é que ambiciona para o futuro? Ir para clubes de outra dimensão, treinar em Portugal…
Logicamente que Portugal terá sempre a emoção atrás de uma decisão. Mas neste momento não faz parte dos meus objetivos [regressar a Portugal], porque o mercado é complicado, é um mercado muito concorrido, que não dá muita segurança aos treinadores, e eu quero ter um bocadinho mais de estabilidade neste momento. Logicamente, se surgir uma proposta que seja tentadora a nível de projeto vou sempre considerar, mas neste momento estou bem onde estou. Queria chegar a uma 1ª liga europeia rapidamente e quando vim para a Finlândia queria fazê-lo em três anos. Consegui-o ao fim de um ano e tal e agora quero viver esta experiência na 1ª Liga, quero afirmar-me como treinador de 1ª liga e quero chegar também a uma equipa que jogue competições europeias rapidamente. Não estou a ver isso acontecer em Portugal neste momento, sabendo que uma entrada em Portugal irá acontecer muito provavelmente no futuro, porque é uma coisa que eu quero fazer.
É certo que as coisas não têm sido só “rosas”, mas a minha carreira tem corrido bastante bem e, acima de tudo, tem sido uma grande aprendizagem do ponto de vista pessoal e profissional.
Mas sente que na Finlândia terá mais possibilidades e outra segurança naquilo que são os projetos desportivos, sem aquela “pressão” dos resultados, como acontece muitas vezes em Portugal?
Aqui – e especialmente neste clube – também houve muito a pressão dos resultados este ano. A questão é que todas as cláusulas de contrato que são exigidas em Portugal não fazem muito sentido, porque a verdade é que o treinador vive o dia-a-dia e às vezes não tem espaço para trabalhar em Portugal, porque é um mercado muito concorrido, é uma cultura muito mais emocional do que as culturas nórdicas, o que tem os seus pontos positivos, mas também os seus pontos negativos. E a verdade é que não troco aquilo que tenho neste momento numa 1ª liga europeia, para ir – com todo o respeito – para um Campeonato de Portugal ou para uma Liga 3, mesmo para os sub-23. A verdade é que o meu mercado talvez ainda não me permita chegar às ligas que quero em Portugal, portanto também não tem problema nenhum.
É preciso ter paciência?
Exato, ainda sou jovem. [risos]
Em Portugal temos a ideia de que o nível do futebol nos países nórdicos, em termos de qualidade, de infraestruturas e de organização, é um bocadinho diferente, talvez para pior, relativamente a Portugal. Isso corresponde à realidade ou não?
É evidente que quando falamos de futebol em Portugal e do jogador português há uma qualidade reconhecida mundialmente, que se bate com as melhores seleções do mundo e com as melhores ligas do mundo. Logicamente que a qualidade do jogador português em si é melhor do que a qualidade do jogador finlandês, não há dúvidas disso. Agora o jogador finlandês, à semelhança do jogador sueco, do jogador dinamarquês, do jogador norueguês, é um mercado que está crescendo muito no futebol europeu, os jogadores estão a desenvolver-se e cada vez começa a haver mais jogadores escandinavos nas ligas centro e sul europeias. Acho que isso vai ser uma tendência que vai começar a crescer, não tenho dúvidas. Em termos de condições, aqui também temos muito boas condições para trabalhar, uns clubes melhores outros piores. Não nos vamos equiparar às condições de Benfica, FC Porto, Sporting, eventualmente Sp. Braga ou Vitória de Guimarães, mas os clubes grandes aqui na Finlândia, em termos de infraestruturas, se calhar estão à frente de alguns clubes de 1ª e 2ª liga em Portugal. Mas sim, o futebol aqui é diferente! Portugal é a sétima liga mundial e acima disso há pouco.
Como é a vida na Finlândia? Muito diferente de Castro Verde, presumo?
A vida aqui é essencialmente diferente agora no inverno. No meu caso, tenho tido o benefício de, normalmente, não estar cá de novembro para frente, até à segunda semana de janeiro, portanto, evito logo esse período do ano, que é duro. Na pré-época, durante janeiro e fevereiro, o tempo ainda é frio, mas a partir de março começa a melhorar e o verão é espetacular, as temperaturas são bastante boas.
E em termos de qualidade de vida?
Sem dúvida que os países nórdicos têm muita qualidade de vida.
O Gonçalo é de Castro Verde, foi jogador do FC Castrense e do FC São Marcos… Continua a acompanhar o futebol distrital?
Todos os fins de semana vejo os resultados, tanto da 1ª como da 2ª divisão distrital, acompanho as equipas do Campeonato de Portugal também… Não posso dizer que tenho um conhecimento profundo das equipas e a verdade é que não vejo um jogo do distrital de Beja, se calhar, há nove ou 10 anos. Mas acompanho os resultados, até porque continuo a ter muitos amigos que estão envolvidos ainda em equipas que estão a competir, sejam pessoas com quem joguei, sejam pessoas que conheço que são agora treinadores… Portanto sim, sigo de perto, e é também uma forma de me ligar às minhas raízes, de não me desligar do Alentejo – e de Castro Verde neste particular – e de ir sabendo daquilo que é a evolução do futebol na associação de Beja.












