Rostos enegrecidos pelo pó, mãos feridas pelas pedras, fatos-macaco encardidos e rasgados, botas enlameadas e pesadas, olhares cansados: é esta a imagem que muitos ainda têm na cabeça quando se fala de uma mina. Um trabalho duro e perigoso onde era (quase) raro encontrar uma mulher. Era, mas já não é! Os tempos mudaram radicalmente e na mina de Neves-Corvo, no concelho de Castro Verde, são muitas as mulheres que contrariam os estereótipos e labutam dia e noite ao lado dos homens. Seja no fundo ou à superfície, na lavaria ou nos laboratórios, a igualdade de género é uma expressão que ganha sentido na maior mina de Portugal.
“Nunca senti esse choque” [de uma mina ser local de homens], conta ao “CA” Graça Pereira, 49 anos e natural de Aljustrel, que trabalha em Neves-Corvo há quase três décadas. Assistente operacional no laboratório, Graça Pereira lembra que entrou na mina numa altura em que foram contratadas muitas mulheres para as mais diversas funções. É verdade que “no fundo da mina nessa altura não havia mulheres, mas havia na lavaria, havia no laboratório e havia nos escritórios. Já havia muitas mulheres aqui”, observa.
Para Ana Abreu, 34 anos e natural da Covilhã, a Somincor acaba mesmo por ser “um caso excepcional” em matéria de igualdade de género em Portugal. “Eu que sou da zona das minas da Panasqueira sinto que aqui é diferente. Lá o contexto é outro e são poucas as mulheres que vão à mina”, acrescenta esta técnica do Departamento de Barragens, onde trabalha há pouco mais de um ano.
Daniela Mendes é o melhor exemplo para comprovar o que sente Ana Abreu. Esta jovem de 25 anos, que nasceu em Oliveira do Hospital, é mineira polivalente e trabalha no fundo da mina, na britagem… e ao volante de uma máquina que pesa toneladas.
“Esperava ser mais difícil, mas é mesmo um hábito”, conta a jovem mineira, que não poupa elogios aos colegas masculinos. “Quando entrei eles ajudaram-me em tudo. Como é que se faz, como é que não se faz… Foram impecáveis, não tenho que dizer de ninguém”, afiança.
“Aqui as mentalidades são muito evoluídas e nota-se que nesta empresa há igualdade salarial. Se uma mulher ou um homem fazem a mesma função, ganham exactamente o mesmo. E isso, infelizmente, não é algo muito comum no país”, destaca por seu lado Mara Dias, de 33 anos.
Natural de Colares (Sintra) e licenciada em engenharia de mina, Mara Dias integra a equipa de geo-metalurgia das lavarias e é uma das duas mulheres (juntamente com Daniela Mendes) que faz parte do grupo de intervenção da Somincor. “A recepção foi muito boa, com a maior respeito, a maior entreajuda, o maior companheirismo”, revela a técnica, que diz acreditar “na igualdade de oportunidades de género, não na igualdade de género”.
É isto que leva a que o Dia Internacional da Mulher, assinalado a 8 de Março, continue a ser uma data importante para Mara Dias. Pelo simbolismo, não propriamente “pelos jantares folclóricos”.
“Não nos podemos esquecer que o Dia Internacional da Mulher existe porque cento e muitas mulheres foram queimadas vivas numa fábrica [nos EUA] porque fizeram uma greve para exigir trabalhar menos de 16 horas por dia e ter melhores condições salariais. Mas hoje em dia parece que o Dia da Mulher é o dia do ‘vale tudo’. […] Acho que há uma grande falta de respeito por si mesmo quando vejo mulheres a comportarem-se dessa maneira”, conclui.
