Por vezes apossa-se de mim uma irritação profunda e nada tem de consciente ou propositado. É como quem vai beber um copo de água porque está cheio de sede e depois, no terceiro ou quarto gole, a água parece que fica entalada no gorgomilo e não desce.
É uma aflição.
E quando me vejo nesta situação, que me acontece mais amiúde do que eu gostaria, há um momento de clareza em que respiro fundo e procuro perceber a razão.
Vasculho nos confins dos sentidos, nas entranhas dos sentimentos; busco no acervo de memórias e arquivos mais recentes qual poderá ser a causa. Entretanto, bebo dois ou três cafés para ajudar, mas por norma não ajudam e conclusões nem uma. Geralmente resigno-me ao habitual “Ah! Dormi pouco!”.
Mas na maior parte das vezes convenço-me de que sou vítima de um complô universal. Ajuda-me. E segundo esta hipótese, uma entidade qualquer diverte-se com o meu quotidiano e passa horas a tecer esquemas para me tramar – e agora parece a canção do Rui Veloso. Oh meu deus onde vai a minha adolescência, ainda que só agora me apareçam borbulhas no rosto e isso me cause algum transtorno, mas desconfio que não passem de mais uma vingança desse ente que me atormenta.
Imaginemos que de facto existe alguém que nos tece a vida num tapete sem fim. Se de facto isto acontece, o meu tapete é uma espécie de labirinto indecifrável, qual Picasso no pico do desvario cubista. Com os fios todos torcidos, cheios de nós e pontas soltas, e figuras irreconhecíveis bordadas num pano gasto e amarrotado.
E é agora o momento de anunciar uma verdade tormentosa, deixando à consideração de quem me lê a relevância que possa ter para esta minha teoria da perseguição maléfica: no segundo período do meu sexto ano tive negativa a trabalhos manuais. Era aquele o tempo de meninas e rapazes serem separados, indo estes fazer bases de madeira para tachos, enquanto aquelas ficavam com a professora para aprenderem a bordar.
Não parece uma prova inequívoca de que algo se passa? Na única altura da minha vida em que tenho de bordar, como qualquer donzela prendada, enrolo as lãs, sujo o pano, choro pela incapacidade de dar forma ao coelho – que era tão bonito na revista -, e ainda por cima tenho um mísero dois no final do período?
Se isto não é prova, não sei o que será.
Comecei o rol de queixumes falando dos ataques de irritação profundos que tomam conta de mim, uma pessoa bondosa e bem-disposta por natureza, na busca incessante de uma razão para isto.
É certo que várias vezes me foi colocada a questão: “Mas tu bates bem?” e eu nunca sei o que responder. Se por um lado sou perfeitamente capaz de manter relações sociais e afectivas que se encaixam no padrão que designamos por costumeiras, há estes achaques que são impeditivos de me sentir totalmente honesta quando respondo: ”Sim, eu sou normal!”

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