Há palavras que nos habituamos a pronunciar e nunca nos lembramos de questionar as suas origens. São palavras que entram no nosso quotidiano com naturalidade e acabamos por lhe encontrar uma familiaridade que dispensa qualquer explicação. Por exemplo: “oxalá” e “cronologia”. “Oxalá” é palavra usada quando pretendemos a realização do nosso desejo e tem origem árabe, significando “ouça Alá”. É o mesmo que dizer “Deus me ouça” ou “Deus queira”. “Cronologia” significa sucessão temporal e tem origem na palavra “Cronos”, nome de uma divindade da mitologia grega que tinha por missão reger o tempo (a passagem das idades).
A palavra “gazeta” é uma das que tem origem desconhecida para muitos de nós, mas que a tradição nos diz ser sinónimo de jornal, o que nos basta, não nos impelindo na procura da sua verdadeira origem. Eu ouvi a sua história recentemente, num programa radiofónico (RDP Antena 2), e porque a desconhecia, senti vontade de passar este meu recém-adquirido conhecimento aos leitores do “Correio Alentejo” que, eventualmente, também a não conheçam.
O termo “gazeta” foi, de facto, encontrado para designar aquilo a que hoje chamamos “jornal”: uma publicação periódica divulgando notícias, anúncios e comentários. A primeira publicação com tais características, intitulada “Gazzetta Veneta”, surgiu em Veneza no início do século XVII, e tomou o nome do valor que era o seu próprio custo: uma “Gazzetta” (moeda que era cunhada em Veneza desde o século XVI).
Desvendado o enigma da origem da palavra, ela vem, ainda, colada a outras curiosidades. Como facilmente se percebe, naqueles tempos não existia a profissão de jornalista. Não havia quem auferisse rendimento pelo facto de redigir notícias. Os jornais (as gazetas) eram feitos por carolice e gosto daqueles que alimentavam o “bichinho” da comunicação, e procuravam as notícias no meio onde viviam para as levar ao conhecimento de toda a população da cidade através da folha que compunham e imprimiam artesanalmente (afinal, tal como ainda hoje se faz muita da nossa imprensa regional!).
Porém, tal trabalho de recolha das notícias, a sua redacção, composição tipográfica e impressão, obrigava a um labor suplementar daqueles que produziam os jornais, que não viviam disso, e que, habitualmente, impedia o cumprimento dos seus deveres profissionais, levando o jornalista-tipógrafo a faltar ao seu emprego no momento do fecho e da impressão do jornal. Dizia-se, então, que o fulano faltou ao trabalho pelo facto de estar a fazer a gazeta. Daí vulgarizar-se o termo “gazeta” para referir a falta ao trabalho e, por extensão, à escola!
É esta, em resumo, a história que eu ouvi e achei curiosa. Por isso quis partilhá-la com os leitores do “Correio Alentejo”. Permiti-me completá-la com estas outras informações colhidas no livro <b><i>História da Imprensa </i> </b> (Planeta Editora. Lisboa, 1996):
Em Portugal o aparecimento da imprensa tem duas certidões de nascimento. Uma para a imprensa tipografada e outra para a manuscrita (embora não deva receber o nome de “imprensa”, não deixa de ser um órgão de comunicação escrita). Esta, dava conta, em duas páginas, da destruição da Armada Invencível, com o comprido título “Notícias da Infelicidade da Armada de Sua Majestade Que Escreveu o Mestre de Santa Catarina”, e era datada de 19 de Outubro de 1588. Antes, porém, em 1556, surgiu a primeira publicação de “Relações”, em forma tipografada.
A produção das “Relações” foi intensificada na primeira metade do século XVII e muitas delas incitavam o povo a sublevar-se contra a dominação espanhola que durou 60 anos (1580-1640). Em 1627 já eram tantas as “Relações” contra os castelhanos, que a coroa espanhola se viu obrigada a decretar a censura às publicações periódicas. Assim foi promulgada a primeira lei de imprensa portuguesa (e começou mal, porque decretava a sua submissão ao poder!).
Durante todo o século XVII e XVIII abundaram publicações de prognósticos, como calendários, almanaques, pasquins e folhas soltas distribuídas clandestinamente, como meio de fugir à censura que o poder decretou, e levar ao povo as verdades que a coroa ocultava (eram os jornais “Avante” da época!). Este historial estará na base do aparecimento das “Gazetas da Restauração” com conteúdos mais informativos. Segundo José Tengarrinha, a primeira delas transformou-se no primeiro jornal português, foi inspirada na “Gazette de France”, e teve um título que, em comprimento, ganha ao anteriormente citado. Era a “Gazeta em Que se Relatam as Novas Todas Que Houve Nesta Corte e Que Vieram de Várias Partes no Mês de Novembro de 1641”. Foi publicada em Lisboa com o privilégio real concedido a Manuel de Gallegos.
As “Gazetas da Restauração” tinham uma difusão muito restrita derivado a dois factores: eram demasiado caras e o analfabetismo fazia regra entre a população. Para além disso, eram submetidas a uma censura prévia estabelecida por D. João IV, que, na matéria, continuou na senda do que tinha feito a coroa espanhola.
A proliferação de jornais veio satisfazer a necessidade do consumo de notícias e provocou o aparecimento da profissão de jornalista. O primeiro jornalista português foi António Sousa de Macedo (1606-1682).
Nascido no Porto, foi escritor, diplomata e embaixador nos Países Baixos. Regressado a Portugal fundou o jornal “Mercúrio Português” em 1663, que se publicou durante quatro anos e teve brilhantes colaboradores, entre os quais se contava o padre jesuíta António Vieira. Após a desaparição deste jornal deu-se início a uma série de periódicos com o título “Mercúrio”.
Depois houve um tempo sem publicação de jornais e a dificuldade de sobrevivência da imprensa obrigou a que houvesse uma colagem dos periódicos ao Estado. Assim nasceu, em 1704, a “Gazeta”. Em 1715 surgiu a “Gazeta de Lisboa” (antecedente do “Diário da República”) que publicava notícias do Governo, tinha uma tiragem de 1.500 exemplares e era redigida pelo seu fundador, José Freire de Monterroio Mascarenhas, que o dirigiu durante mais de 40 anos. A “Gazeta de Lisboa” foi popularmente designada por ”Gazetas do Montarroio”, terminando a sua publicação em 1760, substituída pela “Gazeta dos Oficiais de Secretaria”, por sua vez mandada encerrar, dois anos depois, pelo Marquês de Pombal.
Desde então têm surgido no panorama da imprensa regional várias “Gazetas”, jornais regionais que veiculam as notícias da sua região não só internamente, mas também a quem vive emigrado e que espera o jornal como se fosse carta de família. Preservemos e ajudemos estas “Gazetas” que cumprem a nobre missão de informar.
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