Os blogues

Quinta-feira, 17 Setembro, 2020

Hugo Lança Silva

professor do ensino superior

Começo por um esclarecimento que funciona como declaração de interesses: gosto de blogues, apesar de não ser apreciador da blogosfera. Eu próprio tenho um blogue pessoal e no âmbito da minha actividade académica estou ligado a outros 10! Mais do que isso, tenho estudos publicados sobre o tema, tendo sido, no que concerne aos juristas, pioneiro (em Portugal) no estudo destas temáticas!
Estive e estou convicto que os blogues (bem como outros espaços na Internet) têm um papel crucial para o aprofundamento da cidadania, podendo ser um instrumento extremamente útil no incremento da qualidade da democracia! Com estes quebra-se um velho paradigma da informação controlada, seja pelo poder politico, seja pelo poder económico, uma nuvem de censura que sempre perdurou na nossa ainda insípida comunicação social, demasiado dependente dos humores dos governos e das autarquias!
A possibilidade de qualquer cidadão poder dizer o que lhe aprouver, criando o seu próprio blogue ou participando no blogue de outros, reforça consideravelmente a democracia, dá brilho à liberdade de expressão, aumentando a transparência e contribuindo para o esclarecimento, (pelo menos daqueles que gostam de ser esclarecidos)! E se o que fica escrito é uma verdade quando se tem por horizonte os blogues nacionais, a veracidade da premissa reforça-se quando pensamos em realidades regionais e locais: em muitas aldeias e vilas do país não há imprensa, sendo os blogues os únicos e verdadeiros “meios de comunicação”; em algumas cidades, apesar de existir imprensa, a mesma é de tal forma condicionada pelos poderes, que os blogues podem funcionar como ventos de verdade e coragem!
Mas do meu entusiasmo conhecido e declarado pelos blogues, não se pode inferir que desconheça as suas fragilidades. E subscrevo Miguel Sousa Tavares quando afirmou qualquer coisa como “os blogues e a Internet parecem ter sido inventados para servir as piores características dos portugueses”.
Com efeito o (aparente) anonimato que a Internet propicia, tem sido uma janela aberta para um crescer de insultos e acusações vergonhosas, daqueles que corajosamente escrevem de forma anónima, ofendendo outros sem assumirem as suas palavras, confundindo liberdade de expressão e direito ao disparate, com liberdade para achincalhar e atacar livremente, fomentar boatos e perseguir a honra e o bom nome de pessoas e instituições!
E se este cenário é conhecido, tudo piora com o aproximar dos ciclos eleitorais, onde brotam de pedras feias e sujas um conjunto de blogues e comentadores, sempre disponíveis para o insulto pessoal, seja nos seus próprios blogues, seja naqueles que são criados para fomentar a maledicência, seja naqueles que existem há alguns anos e sempre se procuraram pautar por níveis, maiores ou menores, de respeito pela diferença! Com efeito, antes de ditar para o papel estas palavras, fiz uma ronda por a blogosfera da região e, quer nos textos, quer sobretudo nos comentários, podemos ler coisas que deixariam a Cicciolina envergonhada!
Importa deixar claro que a questão não é apenas de moral e ética: porque a questão é também jurídica! Por um lado o anonimato é mais aparente do que real, existindo hoje os meios que permitem descobrir quem foi a pessoa que escreveu anonimamente determinado conteúdo num qualquer blogue; por maioria de razão, também é hoje possível descobrir quem é o verdadeiro autor de determinado blogue, desde que este ultrapasse a barreira da legalidade, confundido liberdade de expressão com autorização para a injúria ou difamação. Por outro lado, começa hoje a fazer doutrina o princípio que desde sempre defendi, que o autor de um blogue pode ser (em determinadas circunstâncias!) penalmente responsável pelos conteúdos que terceiros escrevem nos seus blogues!
Porque isso é bom para os blogues! Porque isso é bom para a cidadania! Porque isso é bom para a democracia!

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