Imbuído no meio de prazos e projectos, o sono tranquilo foi atormentado por um pesadelo que me despertou inquieto! O sonho – vamos baptizá-lo assim para fugir da redundância – era sobre a cidade de Beja sem que nunca tenha existido Ensino Superior.
Pela mente perpassou-me uma cidade em que os jovens tinham de migrar para Lisboa para continuar os seus estudos – caso as famílias tivessem condições económicas para suportar esta imensa empreitada –, sendo que na sua gorda maioria eram forçados a engrossar abruptamente o mercado de trabalho não qualificado, onde quer que os empregos os levassem! Uma região em que as largas centenas de pessoas às quais a vida esbulhou na adolescência a possibilidade de seguirem estudos superiores não teriam tido a possibilidade de, na idade adulta, perseguirem um desejo de criança e em regime pós-laboral alcançarem a almejada licenciatura.
Em sobressalto, imaginei uma cidade que, se hoje tem imensas carências de quadros qualificados, não oferecia nenhumas condições para o regresso a casa dos filhos da terra, abandonando-os à sua sorte no litoral do país ou pelo estrangeiro, quebrando os laços que os ligam à cidade onde cresceram.
Acordei sobressaltado com a imagem da cidade que conheci na primeira adolescência, embora agora duas décadas mais envelhecida, sem milhares de jovens de diferentes partes do país, que nos ofereceram a sua alegria e colorido, diversidade de culturas e formas de estar, pequenos excessos próprios da idade, embrulhados numa imensa curiosidade em viver; jovens adultos que o destino senta há uma década em mesas frente à minha, que vejo crescer, desenvolverem projectos, lançar propostas, que chegam com medo de uma cidade desconhecida e inóspita ao primeiro olhar, para se tornarem mais bejenses que muitos dos que aqui nasceram e chamam a cidade de sua, para partirem com lágrimas de saudade.
Neste meu sonho aflitivo, no mês de Maio milhares de pais e famílias não enchiam um feliz sábado da cidade, para uma Bênção das Pastas religioso-folclórica, onde se evoca o fim das licenciaturas, perante uma cidade surda, onde ano após anos, grande parte da imprensa e todos os poderes políticos tentam ignorar um evento onde se festeja a importância e peso dos estudantes nesta cidade.
No meu pesadelo, a cidade estava ciente da impressionante pertinência do Ensino Superior, pelo que a opinião pública (e publicada) não perdia tempo a escalpelizar os momentos em que os estudantes erram, tentando escamotear os seus inúmeros aspectos relevantes, regurgitando o fantasma das praxes, procurando com argumentações científicas justificar que estes estudantes não aumentam a vida cultural da cidade ou gracejando que sem os estudantes quiçá diminuíssem alguns pequenos actos de vandalismo.
No meu sono atormentado pela trovoada que raiava no horizonte, a sociedade civil bejense – porventura outra ilusão de uma noite mal dormida – esquecia divergências mesquinhas e unia-se em torno de projectos importantes para a região, incapaz de assobiar para o lado quando assistisse ao lento agonizar de uma universidade que, goste-se mais ou menos, todos devemos reconhecer a imensa importância que teve para a região.
Nas divagações sonâmbulas deste que vos escreve, era despiciendo justificar a importância do Instituto Politécnico de Beja (IPB) com a tirania da matemática, um verdadeiro fascismo dos números, confrontando o leitor com o facto de o IPB ter actualmente aproximadamente 3.000 alunos e mais de quatro centenas de funcionários, docentes e não docentes, tornando-se na grandeza da estatística, a maior empresa da região. Neste meu sonho, era desnecessário firmar que se cada aluno, em média, despende cerca de 350 euros mensais, a economia real e paralela de uma pequena cidade como Beja, estão dependentes do sucesso desta cada vez mais complexa empreitada.
Não ignoro que nem tudo está feito, que se podia fazer mais e melhor. Não sustento que pessoas ou instituições devam estar acima de todas as críticas, não me coibindo eu próprio de as fazer, quando as entendo pertinentes! Se é tremendamente saudável desejarmos sempre um pouco mais, importa, de quando em quando, meditar sobre o que temos, recordar o longo e complexo percurso que nos guiou até aos dias de hoje e desenhar num rosto o sorriso tranquilo de quem acorda com a certeza que teve apenas um sonho mau! Mas com a profunda convicção que os pesadelos de hoje podem ser a realidade de amanhã, que mais difícil que conseguir Ensino Superior em Beja é conseguir mantê-lo, sendo uma batalha de todos lutar para que esta realidade seja eterna…
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O concerto da harpista austríaca Elizabeth Plank é um dos destaques do programa do festival “Terras Sem Sombra” (TSS), que neste fim de semana, dias