O Natal é… um círculo!

Quinta-feira, 17 Setembro, 2020

Margarida Janeiro

jornalista

Na liturgia diária de Sics, Tvis e Rtps apelam-nos aos sacrifícios, às abstinências, às privações, às renuncias e uma vez finda a homilia seguem-se os comentadores de serviço reiterando que sim, que sim senhora, que tem mesmo que ser assim. Blá, blá, blá…Blá, blá, blá…Ámen!
Mas, nestas alturas que se aproximam tenho para mim que o melhor é sintonizar outras ondas hertezianas e foge-me a lembrança pró Natal. Entranha-se-me na memória paralela aquela película doce que embrulha os pensamentos, soam gritinhos histéricos de crianças na casa grande da aldeia, um frio que não sentíamos, a mesa corrida, grande de uma ponta à outra da sala e no fim o chupão com os nossos pais arrimados. A cadeira do meu avô sempre à cabeceira, carnes, sopas de pão, sumóis e laranjadas, uma roupa nova estreada, as cassetes dos greateast hits, as barriguitas, um anel de prata e o primeiro de ouro e primeiro também o perfume Cacharel num certo Natal. Desnoção de horas e tempos. O congelamento de um dia mágico.
Não sendo católica, apostólica, romana gosto do Natal porque nos reunimos em círculos. Os círculos fecham-se, as pessoas vertem-se para dentro deles celebrando a persistência da vida, a passagem de mais um ano, a sorte de ser família e a vontade dar presentes como que a dizer ofereço-te isto “assim e assado” porque estás presente em mim.
Não posso, por estas e por outras, desvincular o Natal da cidade onde para mim sempre tem tido lugar. António Lobo Antunes ao passar por ela disse “Em Beja sinto-me eterno” e logo, logo eu pensei que tivesse estado na nossa Biblioteca. Depois ainda ocorreu-me que algures a minha avó lhe tivesse feito alguma das suas torradas com Planta ou oferecido um par de meias com notinha, mas não! O escritor só pode ter dito aquilo por causa dos desenhos da Susa Monteiro que lhe ilustram as crónicas da Visão ou, calhando, passou uma tarde a beber do vinho do amigo Baiôa. Pode, no entanto, e ainda ter passado pelo sr. Pereira e comido torresmos do rissol ou ter ouvido o Paulo Ribeiro de olhos fechados e cabeça levantada cantar na sala do fundo do Desassossego. Terá sido levado pela mão de uns amigos a ver os espectáculos de encantar que fazem as Lêndias ou lido as cartas da Mariana numa noite quente de Agosto na Pousada? Ou ainda comido pastéis de nata das Maltesinhas ou empadas do Luís da Rocha.
Certo é que Natal é Beja e Beja é Natal. E, portanto, é isto!
Aos bejenses e aos portugueses em geral deve dar-lhes também, como diz um amigo, “o coração a pancada” e ficam moles, derretidos, com um je ne sais quoi de hipnotizados pelas luzecas piscando, piscando de maneiras que vai daí e acareiam uns trocos para as prendas das crianças, comem e bebem em casulo aquecido e, se forem como eu, nesse dia não ligam sequer a televisão. Não há missas para ninguém!

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