Esta palavra latina significa, na nossa língua, “aqueles que vão morrer”. Na antiga Roma, os gladiadores davam a si mesmos esse nome quando, na arena, dispostos a enfrentar a morte, cumprimentavam o imperador: “Ave, Caesar, morituri te salutant” (Avé, César, os que vão morrer saúdam-te).
Mas “morituri” é também o nosso nome. Estamos vivos e, portanto, somos aqueles que vão morrer. Vamos morrer. Hoje mesmo ou daqui a algum tempo, com mais ou menos dor, com ou sem sangue.
As estatísticas dizem que morrem no mundo, por minuto, muitas dezenas de pessoas… Existe uma lei inexorável à qual nenhum de nós poderá escapar. Devíamos pensar na morte. Analisá-la. Medi-la. Não como quem mede um inimigo, para ver se é possível derrotá-lo, mas como quem olha para dentro de si mesmo com o objectivo de se conhecer.
De todos os seres vivos, só o homem possui o conhecimento certo de que vai morrer. Esse conhecimento – manifestação da grandeza do homem – é luminoso e útil: permite-nos saber o que somos e o que são realmente todas as coisas; permite-nos tirar conclusões sobre o sentido da nossa existência – temporária, passageira – neste planeta que deambula num universo imenso.
Há muitas coisas que adquirem uma importância e uma cor diferentes no momento em que um médico nos vem dizer que temos apenas umas poucas semanas de vida. Que nos importa então se o nosso clube ganhou ou perdeu, se o jantar é carne ou peixe, se visto esta camisola ou aquela, se certa pessoa disse aquilo de mim?…
Visto à luz da morte, tudo isso adquire a sua verdadeira envergadura. E entendemos, então, o que é importante e o que não o é tanto. Ilumina-se o nosso olhar. E isso é útil para nós. Tira-nos de certos enganos a que somos extremamente atreitos.
Temos visto frequentemente como tantas pessoas orientaram a sua vida de acordo com as conclusões que tiraram de pensar na morte. Uns, considerando-a como final absoluto da existência, dedicaram os seus dias a satisfazer ao máximo os apetites, a obter o máximo possível de prazer… antes de que tudo acabasse. Outros consideraram que era possível viver eternamente – viver depois disto – e impuseram a si mesmos uma forma de vida com regras bem diferentes das dos outros, de forma a possuírem a esperança. Trocando o conhecido pelo desconhecido, o imediato pelo distante, o pequeno pelo grande.
Mas nós… temos medo. Custa-nos pensar na morte. Gostamos de viver – porque a vida é uma coisa fantástica – e nem queremos pensar em pensar que ela possa terminar. Adiamos uma análise e uma luz e uma orientação que de todo nos são necessárias.
Temos muito tempo… E apressamo-nos a pensar noutra coisa quando a morte toca em alguém que estava perto de nós. E procuramos distracções, para fugirmos a uma reflexão que a nossa própria natureza nos exige. E ocupamo-nos em futilidades.
Temos muito tempo… Mas o tempo é qualquer coisa que se corta num golpe súbito de tesoura, quase sempre sem aviso. Três semanas, três anos, trinta anos… O tempo é apenas tempo. É água que escorre entre os dedos das mãos.
A verdade é que não temos muito tempo.
Enquanto cometemos a tolice de ir vivendo como se fôssemos viver… sempre, a nossa vida está às escuras, à espera de um acto de coragem que lhe dê cor e sentido.
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