A comunicação social deu a conhecer um relatório oficial onde se refere que os portugueses esperam, em média, três meses e meio por uma cirurgia a tumores malignos, sendo que em alguns hospitais, nomeadamente no Algarve, o tempo de espera chega quase aos sete meses. No Alentejo, quem padeça de cancro espera, em média, mais de quatro meses por uma operação. Estes dados mostram-se tanto mais escandalosos quando comparados com os padrões internacionais, onde o tempo de espera que é clinicamente aceitável para operar neoplasias malignas não deve ultrapassar os 14 dias.
Na minha opinião, os dados deste relatório revelam muito simplesmente que temos um Estado homicida, um Estado que facilita a morte de milhares de doentes oncológicos. Quantas pessoas podiam ter sido salvas, e quantas pessoas podiam ter tido a sua saúde radicalmente melhorada, e, desta forma, aumentada a sua esperança média de vida, se em vez de esperarem quatro, cinco ou seis meses por uma cirurgia, tivessem sido operadas no prazo de duas semanas?
Que espécie de Estado de direito é este que fecha os olhos ou encolhe os ombros face ao sofrimento e à urgência de quem pode ter a vida decidida a “curto prazo”, como é o caso em muitos cancros malignos de agravamento galopante?
Que espécie de Governo socialista é este que anda há anos a tentar tirar à sorte onde vai gastar largos milhões de euros, entre candidatos a aeroportos e TGV´s, entre mais milhar ou menos milhar de adjuntos e assessores, entre mais milhão ou menos milhão de lucro especulativo e parasita consentido a financeiras e bancos, e deixa milhares de portugueses doentes e pobres abandonados ao inferno de acreditarem que por um milagre podem ser operados prá semana, quando sabem que só o podem ser daqui a uns quantos meses, se é que chegam até lá…
Sim, portugueses pobres, porque os portugueses com cancro, mas com possibilidades económicas, recorrem a bons hospitais ou clínicas privadas, em Portugal ou no estrangeiro.
E quando ouvimos um médico dizer a um paciente com cancro que a operação não vale a pena, talvez agora se perceba melhor porquê… Porque, em muitos casos, à data marcada para a operação já não haveria vida nenhuma para operar…
<b>2.</b> Os resultados surpreendentes obtidos pelas listas de candidatura independentes nas eleições intercalares para a câmara de Lisboa, ao que se pode somar o <i>score </i>eleitoral conseguido por Manuel Alegre nas últimas presidenciais, e o punhado de vitórias de listas independentes nas últimas autárquicas, configuram uma tendência política, cívica e eleitoral que suscita múltiplas leituras, e nem sempre convergentes.
Um dos sentidos possíveis da análise deste fenómeno relativamente recente da nossa democracia política, nascido com o fim do monopólio da representação que estava nas mãos dos partidos, é o que consagra a crise dos partidos; crise que se desdobra noutras crises associadas entre si: crise de identificação, crise de expressão eleitoral, crise orgânica e política, crise de legitimidade.
De identificação, porque é cada vez maior o número de cidadãos que não se revêem ou deixam de rever-se no estilo de intervenção e forma de organização dos partidos, acentuando-se também uma crise de filiação. De expressão eleitoral porque os partidos são ultrapassados em muitos casos por candidaturas independentes. Crise orgânica e política porque os desaires eleitorais e o aumento da abstenção obriga a constantes insurreições internas e radicaliza a luta pelo poder no interior dos partidos. Crise de legitimidade porque, em consequência de tudo o que se disse, os partidos tornam-se irremediavelmente entidades opacas, incapazes e desajustadas.
Uma outra perspectiva de análise prefere avaliar a criação, afirmação e sucesso eleitoral de listas independentes, mais como uma capacidade de mobilização dos cidadãos independentes, desfiliados ou partidariamente desencantados, no sentido de se constituírem como uma alternativa plausível face ao controlo aparelhístico das candidaturas, do que como um aproveitamento oportunista da sangria generalizada aberta no seio dos partidos, a braços com o descrédito, o clientelismo feroz, e competitividade interna desenfreada.
Ainda é possível uma terceira leitura: a que enfatiza a progressiva personalização das candidaturas e a importância da sua visibilidade e exposição mediática. De acordo com este quadro analítico, os independentes não sustentam a sua angariação eleitoral com base numa diferença política substancial que decorra da sua condição de independentes, mas pelo facto de granjearem uma especial notoriedade pública e social, o que reforça o capital de simpatia potencial e se repercute eleitoralmente, com resultados mais satisfatórios dos que se obtêm quer através do envolvimento das máquinas partidárias, quer pela incomensuravelmente maior disponibilidade de recursos humanos e materiais proveniente das estruturas partidárias.
E agora que estamos a meio do mandato autárquico, seria pertinente equacionar até que ponto não se justificaria uma mobilização cívica e política, o mais possível independente dos partidos, em cidades como Beja, de modo a corporizar um movimento capaz de ser um futuro protagonista da mudança e da alternativa.