<b>1. </b>Foi com alguma emoção, pouca e contida, apesar de tudo, que assisti à animada troca de palavras entre o líder parlamentar do PSD e o primeiro-ministro, na última sessão de debate parlamentar, sobre a iniciativa Novas Oportunidades e sobre os processos de Reconhecimento e Certificação de Competências. É curioso e recompensador que figuras tão gradas da política nacional dêem tal importância a este assunto, principalmente quando recordo os primeiros tempos dos então designados Centros de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências (CRVCC), estávamos nós no ano de 2001. Para quem não sabe, no princípio foram seis centros no país, sendo que um destes seis era promovido pela instituição a que pertenço, enquanto que hoje se apresentam 270, estando definida a meta de mais de 400 em 2010. Desde então conhecemos quatro primeiros-ministros, muitas alterações aconteceram – acabaram os CRVCC, criaram-se os Centros Novas Oportunidades (CNO) já com este Governo, massificou-se a abordagem e o alcance, estendeu-se o processo ao nível do Secundário, definiram-se novas tutelas e voltou-se ao modelo anterior, investiu-se muito dinheiro em campanhas, internalizou-se de forma massiva o sistema nos centros de formação do Estado e nas escolas públicas. Simultaneamente, existiram vertentes que em nada mudaram: a) No início as instituições privadas promotoras de centros recebiam o reembolso dos custos de funcionamento com quase um ano de atraso; hoje, também; b) A opinião pública pouco ou nada percebia sobre a essência do sistema de RVC, então marginal. Hoje, apesar do dinheiro investido em campanhas, apesar da dimensão da rede de CNO, nada se percebe. c) Por último, e não menos importante, o Estado poucas ou nenhumas iniciativas tinha de regulação da qualidade do trabalho desenvolvida pelos CRVCC, limitando-se a verificar metas físicas e financeiras, isto quando a rede não chegava à centena. Hoje, com 270, acham que alguém o faz? Por estas razões, é com ironia (de que outra forma poderia ser?) que observo a evolução das coisas neste final de 2007, com pouca confiança no futuro deste Sistema, que é bom na sua essência mas que está à mercê das decisões de quem não parece conhecê-lo, que está no centro do debate político, justiça seja feita a este Governo, mas que é discutido de forma superficial e geradora de estereótipos que só o desacreditam.
<b>2. </b>Corre na Internet uma petição contra a acção da ASAE que já recolheu mais de um milhar de assinaturas e que até mereceu resposta do organismo, a crer na nota da Agência Lusa. Confesso que foi com admiração que assisti à primeira vaga de acções desta entidade que apreendeu de forma muito mediática produtos alimentares estragados, fora dos prazos de validade, produtos contrafeitos, fiscalizou condições de acondicionamento, de higiene e segurança alimentar, entre outras. Afinal de contas, num país em que até há bem pouco tempo toda a gente se queixava de que não havia fiscalização, que as instituições não funcionam, a ASAE apresentou-se com uma atitude fracturante com este diagnóstico. Curiosamente, o mesmo fenómeno começou a verificar-se na cobrança de impostos, cuja crescente eficácia tem começado aos poucos a dar origem a uma reacção contrária. Da condição de “quase-contribuinte-voluntário” passámos para o “quase-contribuinte-sempre-suspeito-e-até-cobrador”. Enfim, são traços compreensíveis da reacção à evolução das circunstâncias. E se em ambos os casos é possível verificar que lidamos muito mal com um Estado que nos faz cumprir, porque em grande medida este raramente cumpre, é possível também observar que não é ao nível das estruturas de fiscalização que reside o principal problema, e quanto a mim atacável, mas sim ao nível do quadro legal que suporta as suas acções. Será que faz sentido prever na lei que um contribuinte deve assumir o papel de cobrador de impostos junto de um seu fornecedor? Claro que não. Como não faz sentido desenhar um enquadramento legal da higiene e segurança alimentar nacional transposto de forma acrítica dos regulamentos comunitários, que foram a seu tempo construídos por uma cambada de fanáticos de colarinho branco cujo último e mais próximo contacto com a cultura mediterrânica ou do sul da Europa foi durante uns dias num resort no sul de Espanha ou de Portugal, e que a troco de quase nada contraria aquilo que é a nossa tradição, põem em causa aquilo que é o nosso património e a nossa identidade. E quando os nossos legisladores o fazem de forma acrítica, já não é mau, porque a maioria das vezes existem exercícios de requintado nacional-aperfeiçoamento, do tipo mais papista que o papa. É a síndrome do bom aluno, sintoma mais que evidente duma pobreza de espírito que importa erradicar de uma vez por todas. E é a este nível que todos devemos intervir, em primeiro lugar os deputados eleitos, que devem encarar os diplomas legais que norteiam a acção da ASAE de forma bastante crítica face aos óbvios prejuízos que os mesmos acarretam para a dinamização da economia e fazerem aquilo que se coloca ao seu alcance para os modificar.
E com estas duas notas me despeço dos leitores até para o ano, desejando-vos Boas Festas!