“Qual foi para ti o maior atentado à democracia do ano que passou?”. Foi com esta pergunta, que caiu pesada qual cozido à portuguesa em cima de uma barriga já farta, que comecei o novo ano. Após poucos segundos de contestação geral sob a profundidade da questão em momento que devia ser de euforia festiva, as análises começaram, primeiro tímidas, progressivamente mais soltas, depois disparadas ao ritmo das 12 badaladas. A ronda de respostas levou-nos a diferentes contextos e à percepção de que a realidade, assim como certos conceitos, é estranhamente tão simples e simultaneamente tão complexa. Infelizmente apontámos várias situações que considerámos atentados à democracia e o ano acabou sem que tivéssemos dado conta. E nós, democraticamente, elegemos uma outra hora para comemorar. Três, dois, um: “É meia-noite!” e a conversa continuou. E um novo ano ali a começar.
Pensei mais tarde nesta conversa, enquanto passeava na manhã do primeiro dia do ano, ritual em sério risco de se tornar costumeiro. Por momentos, fixei-me num belíssimo monte de musgo vestido pela cacimba da fria manhã e nas memórias quentes que o musgo apanhado a quatro mãos me traz da minha infância. Os pensamentos, tal como as conversas, são como as cerejas, e do musgo do Natal da minha infância veio-me à memória a imagem recente de um Natal passado num hospital. Naquele momento soube qual tinha sido o maior atentado à democracia de que tinha sido testemunha nos últimos tempos – aindiferença. A indiferença enquanto filhos, pais, amigos, cidadãos. É esta a que refiro.
O que terá sentido aquele pai, avó, marido, outrora vigoroso chefe de família, agora velho e doente, que, deitado numa cama de hospital, não foi visitado por ninguém em época de Natal? Para onde terá sido levado aquele outro que à altura da alta do hospital não tinha nenhum familiar à sua espera? O que teria acontecido se o sangue precisado de urgência não tivesse sido doado por alguém?
O ritmo imposto por uma vida cada vez mais exigente em termos profissionais e de sustentabilidade económica apela-nos a descurar outros aspectos da nossa vida pessoal e social. Qual zunido, a indiferença segreda-nos constantemente ao ouvido “segue em frente que alguém se preocupará com isso. Alguém fará por isso”. Os hospitais que se ocupem dos doentes, os lares de idosos dos velhos, as autarquias com o desenvolvimento dos municípios, os partidos com a oposição, o Governo com a crise que eu tenho de seguir com a minha vida. Como se da minha vida não fizessem parte todos eles.
“Democracia”, dizia alguém naquela conversa de novo ano “é poder abster-me de participar”. Também, digo eu, mas é, sobretudo, poder e dever participar. Participar enquanto família, enquanto amigo, enquanto cidadão. O primeiro-ministro advoga que uma das fórmulas para lutar contra a crise é o investimento público. Eu, humildemente, acrescentar-lhe-ia outra, o investimento pessoal de cada um na sua família, na sua comunidade, no seu país. Um ano novo diferente, não indiferente, é o que desejo para 2009, a si e a mim.
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