O 5 de Outubro de 1910 pôs fim ao regime monárquico e ao suposto “direito divino” da realeza que sustentava os privilégios da aristocracia e instaurou a República, regime político democrático cujos fundamentos assentam unicamente na soberania popular e no voto directo e secreto de cidadãos livres e iguais em direitos e deveres. A República estabeleceu também o princípio do Estado laico e a separação entre o Estado e a(s) igreja(s), como garante da liberdade religiosa ou anti-religiosa e da igualdade entre as diversas confissões.
Apesar das limitações na prática do sufrágio universal – só votavam os alfabetizados, menos de 20% da população e os “chefes de família”, o que excluía as mulheres – o regime republicano representou um enorme avanço e uma abertura política na vida dum país com quase oito séculos.
Como é próprio dos regimes democráticos, a República foi palco de intensa disputa política entre diferentes interesses e concepções opostas: associações patronais e sindicais, com destaque para os assalariados rurais do Alentejo; reacção monárquica contra os republicanos e, entre estes, uma crescente diferenciação entre esquerda e direita; concepções patriarcais contestadas pelas primeiras feministas que lutaram pelo direito de voto e de participação cívica das mulheres.
A primeira República foi derrotada, a partir do golpe militar de 28 de Maio que deu início a 48 anos de ditadura fascista, fruto de contradições internas, das quais destaco: o divórcio com a base popular que garantira o seu triunfo em 1910 e até a repressão violenta sobre o movimento operário e sindical; a carestia de vida que causou enorme descontentamento, enquanto as elites se afogavam em escândalos de corrupção; e, sobretudo, a participação de Portugal na I Guerra Mundial, para garantir as colónias na futura partilha imperialista, à custa de enorme mortandade e de epidemias como o tifo.
Da Guerra emergiu a ditadura de Sidónio Pais, predecessora do salazarismo e responsável pela feroz repressão que se abateu sobre o Vale de Santiago, após a greve geral de Novembro de 1918.
O quadro político hoje é totalmente diferente, mas tem pontos de contacto com as circunstâncias da queda da República: agravamento brutal das condições de vida do povo, em tempos de PEC e com o papão do FMI à porta, enquanto as elites que provocaram a crise se atolam em escândalos e fogem alegremente ao fisco na lavandaria dos offshores, incluindo o da Madeira.
O bloco central dos interesses que há mais de 30 anos nos desgoverna, hoje é bicéfalo (PS/PSD), mas faz lembrar o “saco de gatos” do Partido Democrático que toda a gente detestava… mas ia ganhando as eleições e só saía do poder à força de golpes militares. Dir-me-ão que hoje não há tanta instabilidade política (45 governos em 16 anos de República) e que estamos na UE… Mas é perigoso ignorar os ventos de xenofobia que nos chegam de Itália e França, bem como os resultados da extrema-direita neonazi em diversos países europeus.
Nos últimos anos da I República, houve tentativas de corrigir o défice social e de alargar a sua base de apoio popular, nomeadamente a criação do Partido Republicano da Esquerda Democrática, em Abril de 1926, num congresso presidido por Ezequiel do Soveral Rodrigues, presidente da Câmara (1918 a 1924) que introduziu em Beja o telefone, a electricidade e a água canalizada. A Esquerda Democrática, em aliança com o jovem Partido Comunista Português e com os anarco-sindicalistas, de forte influência em associações de classe como os sapateiros e os trabalhadores rurais, chegou a ganhar eleições em Vale de Vargo.
Estas tentativas de regeneração tardia não resultaram, mas a República vendeu cara a derrota. E a resistência ao fascismo não esmoreceu, em particular no Alentejo. Da derrota da I República tirou lições a Constituição da República Portuguesa, saída do 25 de Abril, ao instituir o sufrágio verdadeiramente universal e ao inscrever no seu texto os direitos dos trabalhadores e das mulheres, no quadro de uma democracia política, representativa mas também participativa, económica, social, cultural e ambiental, um espaço de cidadania livre de qualquer discriminação.
Ontem como hoje, estes ideais estão ainda longe da sua plena concretização. Apesar disso e até por isso mesmo, os valores e ideais democráticos da República e da Constituição são uma bússola para enfrentar e vencer os desafios e as lutas do presente.
O reagrupamento da esquerda democrática, em corte com o pântano do “centrão” é inevitável, tal como o confronto entre as direitas do neoliberalismo selvagem e as esquerdas que defendem o estado social e lutam pelo socialismo, no plano nacional e europeu.
E este confronto entre esquerda e direita tem uma batalha importante já na próxima eleição do Presidente da República, em Janeiro de 2011.
OP de Castro Verde com quatro propostas vencedoras
São quatro as propostas vencedoras da edição deste ano do Orçamento Participativo (OP) de Castro Verde, que irão agora ser incluídas no orçamento da autarquia