Ainda há pastores no Campo Branco!

Ainda há pastores

Faça chuva ou sol, para eles o trabalho nunca acaba: seja porque é preciso dar de comer às ovelhas ou conduzi-las a um novo ponto de água, seja para mudar os animais de pastagem ou ajudar nas parições, os pastores têm sempre que fazer.
São é poucos os que ainda querem fazer este trabalho solitário, onde não há feriados nem fins-de-semana e que exige longas jornadas em campo aberto, só ouvindo chocalhos, balidos… e o ladrar do cão de guarda.
“Isto é uma vida muito presa”, confidencia ao “CA” José António Brito, 46 anos, natural de Entradas (Castro Verde) e um dos pastores que ainda hoje existem no Campo Branco. No rosto carrega as marcas de dias e dias passados ao ar livre, com as cerca de 1.200 ovelhas que tem à sua guarda. “O que custa mais é o mau tempo, o frio, a chuva”, afirma.
José António Brito começou a ser pastor aos 19 anos. E fá-lo por “gosto”, tal como acontece com Mário Galamba. “Toda a vida o meu pai foi pastor e eu segui os passos dele. E é isto que gosto mesmo de fazer! Não estudei porque não quis, dediquei-me ao gado e tenho andado sempre com o gado”, conta ao “CA” este pastor de 51 anos, que guarda um rebanho com quase mil ovelhas na zona de Aljustrel.
O mesmo acontece com João Custódio, 51 anos, da Trindade (Beja). “Saí da escola aos 14 anos e comecei a andar atrás do gado”, revela com boa disposição. “Agora tenho umas 1.070 ovelhas e passo o dia no campo”, diz, para logo revelar que entretêm as horas vagas com… o telemóvel! “Está um [pastor] em Évora, está outro noutro lado e fala-se com um, fala-se com outro… E é assim que a gente passa o tempo. Estamos anos sem se ver, mas falamos todos os dias. O telemóvel é a nossa entretenga”, acrescenta.
“Pois eu passo o dia atrás do gado, cantando uma cantiga atrás delas [ovelhas] e com os meus cães por companha. E vão-se passando os dias… E em elas dando vagar, vamos beber um copinho à taberna mais próxima”, conta Mário Galamba. Já José António Brito aproveita as horas de pastoreio para, sempre que pode, moldar figuras em cortiça ou outros materiais. “Pego na faquinha e vou fazendo uns bonecos… Já que não há outra maneira de a gente se entreter, faz-se assim”.
João Custódio, Mário Galamba e José António Brito são pastores por opção própria e não se arrependem do caminho que seguiram, apesar da dureza do trabalho.
“Antigamente havia o ‘moiral’ e havia o ajuda. Agora é uma pessoa sozinha para o gado todo. E antigamente os rebanhos eram mais pequenos, agora são maiores”, diz Mário Galamba, numa opinião partilhada pelo cunhado João Custódio. “As cercas ajudam mais os patrões, porque evita a mão-de-obra. Antigamente um rebanho de 1.000 ovelhas, como o que eu trago, se calhar precisava de quatro pessoas. E agora tenho de fazer tudo sozinho”, nota.
“É claro que tem de se ter um bocadinho de trabalho! Não é a gente jogá-las para ali, voltá-las e pronto”, observa por sua vez José António Brito, dando o exemplo dos últimos meses, em que a falta de chuva obrigou a um esforço suplementar dos pastores. “Com a seca isto complica-se um bocado. Temos de tratar [os animais] à mão e é mais complicado. Foram sete ou oito meses duros. E esta chuvinha foi uma maravilha, é ouro”, diz.
Para estes três homens, é tudo isto que faz com que hoje sejam poucos os jovens que querem ser pastores. “Hoje a escola é obrigatória, uma pessoa faz o 12º ano e depois vai guardar ovelhas? Já não vai… Ninguém quer saber disto! Isto vai ficando acabado e daqui por mais 20 anos pode haver pastores, mas são os próprios donos do gado. Pastores empregados de patrões já não deve haver”, observa João Custódio.
A mesma opinião têm Mário Galamba e José António Brito. “A malta nova hoje não pende para isto… Vemos uns velhotes, já reformados, com 70 e tal anos, atrás do gado porque não há novos que queiram ir para o lugar deles. E por ser mal pago não é… Mas é uma vida presa. E qual é o jovem que quer saber de estar preso hoje?”, questiona o primeiro. “A malta nova não quer saber disso, gosta de estar mais livre”, conclui o segundo.

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Correio Alentejo

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